terça-feira, junho 05, 2018

A versão do Público teve que sair reduzida, por razões de espaço.
https://www.publico.pt/2018/06/05/sociedade/opiniao/contrariando-a-entropia-e-o-antropoceno-1833087
Aqui o 1º original.

Em defesa da sustentabilidade e contrariando a entropia

Há discussões e controvérsia científica sobre se já entrámos numa nova idade geológica, o antropoceno, e até sobre o nome a dar-lhe caso esse facto seja acreditado pelas instituições relevantes na matéria.
As alterações, todavia, já realizadas na biosfera pela nossa espécie não têm precedentes e já existe uma fina camada radioactiva que cobre a Terra, resultante de milhares de ensaios nucleares e das centrais nucleares, sobretudo dos acidentes de Chernobyl e Fukushima, camada essa que está identificada para o futuro.
Não vamos discutir o termo, se relevando de mais ou menos antropocentrismo, pois sabemos que somos nós quem faz a História e esta com H grande é feita por nós com base nos factos num espaço e num tempo determinado.
Mas já a discussão sobre se estamos ou não nesse momento merece referência.
Há quem defenda que essa nova era começou há cerca de 10.000 anos com a domesticação de algumas plantas e animais e as primeiras interferências do homem na biodiversidade e natureza. Outros referem a incerta data da revolução industrial, a queima de fósseis e a utilização de agro-químicos, mas sem dúvida no século XVIII e XIX.
Com as alterações climáticas, o aumento do dióxido de carbono atmosférico é um dado incontornável, também no século XIX , com a globalização da Terra e da economia temos um incremento da extinção de espécies, que prossegue. Alguns autores referem-se hoje à sexta extinção, dado o grande número de espécies que se vão extinguindo, só comparável às outras cinco grandes extinções porque a Terra passou.
Mas é, sem a mínima sombra de dúvida, em 1945 com as primeiras explosões atómicas no Novo México e depois em Hiroxima e Nagasáqui que introduzimos no ambiente elementos incontornáveis. As radiações nucleares dessas explosões estarão presentes na Terra daqui a muitas, muitas centenas de milhares de anos.
Sem sombra de hesitação,  o que na história do universo e mesmo na da terra é o equivalente a milionésimos de segundo de diferença, sobre se é a revolução agrícola, industrial ou nuclear o elemento detonante, o certo é que se não contrariarmos a 2ª Lei da Termodinâmica que nos diz que toda a energia se degrada no quadro da sua utilização, a entropia que aumenta, como um sinal do aumento da desordem e da degradação deste organismo gigante, mas um grão de areia no universo, que é a Terra será irreversível.
A 2ª Lei da Termodinâmica diz-nos que a entropia aumenta nos sistemas isolados. A Terra não o é. Está aberta ao Universo e recebe energia de baixa entropia do Sol. É possível pois diminuir o aumento da entropia.
A história dos que têm procurado contrariar essa entropia e conservar as energias ( que toda ela se mantêm, no quadro da sua degradação como nos diz a 1ª Lei da Termodinâmica) e a defesa deste novo conceito, recente mas que mergulha também no tempo e nos princípios éticos e filosóficos de há milhares de anos,  das grandes religiões e de muito  pensamento filosófico, é uma luta que se desenvolve em múltiplos planos.
Nas instituições, nas acções de milhares de indivíduos e associações, na palavra e nos empenhos e lutas não violentas que inúmeras comunidades ou tantas vezes grupos isolados levam a cabo para defender a sua terra, o seu espaço vital, esse quintal muitas vezes tão desprezado, e no espaço público que procuramos ocupar e onde temos vindo a intervir.
Os rios vivos onde se deve continuar a usufruir do bem comum que é a água a correr e a sua utilização compatível com a manutenção dos ecossistemas, e sobre o Tejo temos tido particular preocupação. O Tejo é um exemplo claro de degradação e de como estas decisões de conservação devem ser articuladas a nível internacional.
Preocupação que é também com a utilização de uma forma de aquecimento da água, a partir da fissão do átomo, que nos dois grupos de Almaraz e no de Trillo afecta, pode afectar este recurso, mas também o ar e os solos onde se terão que gerir as toneladas, toneladas de resíduos desse aquecimento.
Aquecimento que não é, ao contrário do que muitas vezes os vendilhões do templo, mercadores do oligopólio energético, nos dizem um aliado na luta contra as alterações climáticas, mas antes pelo contrário. A nuclear é um aliado do modo de produção e gestão energética, de desperdício e poluição  (irreversível)  que tem na base a queima de combustíveis fósseis para fazer girar as turbinas que vão esmagando a Terra no seu espaço.
Alterar o paradigma de desenvolvimento, mudar as palavras que usamos para o enfrentar, alterar comportamento e modos de ver, ouvir e sentir é um elemento fundamental para criando hegemonia social, alargando as áreas sociais e políticas em que nos situamos, no quadro do pensamento que é sempre individual mas enquadrando-o em lógicas sociais que se devem amplificar, e interligar nesta jangada ibérica, que está, também, ligada a esta Europa hoje em crise profunda e que partilha responsabilidades globais.
O empenho por uma mudança do paradigma energético e de desenvolvimento é transversal e tem que contar com novas políticas públicas. Requer múltiplos actores políticos e sociais, mas também científicos e económicos. E um envolvimento transfronteiriço. A atitude do governo espanhol de avançar com o cemitério nuclear em Almaraz e a mina de urânio de Retortillo sem consultar e ouvir a opinião do governo português está nos antípodas desse empenho na procura de soluções comuns para a crise ambiental que vivemos.
Nós, aqui, vimos dar conta da nossa, toda, todos.
Ricardo Sixto, presidente da Comissão de Energia, Turismo e Agenda Digital do Congresso de Deputados e membro da Esquerda Unida
Pedro Soares, Presidente da Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território,
Descentralização, Poder Local e Habitação e membro do Bloco da Esquerda
Francisco ( Paco) Castejon , Porta Voz Ibérico do MIA e Doutorado em Física
António Eloy, moleiro e escritor


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