sexta-feira, outubro 08, 2010

Há pirilampos no Terreiro do Paço

Para quem como eu deixou há muito de ver luzir as barriguinhas dos pirilampos, suponho que por estes minúsculos e simpáticos insectos estarem em vias de extinção, naturalmente que por culpa exclusiva da “pessoa humana”, ele há boas notícias:

Graças à fértil imaginação de que uma tal de Sociedade Frente Tejo vai dando largas à medida que afeiçoa a requalificação do Terreiro do Paço, cada losango do novo piso da placa central da nossa praça mais importante passou a dispor de 3-4 pirilampos, conforme seja losango inacabado ou perfeito, respectivamente. São os chamados “leds”, a cereja do bolo de um projecto de espaço público e de arquitectura paisagística que nasceu torto e tarde ou nunca se endireitará, pese embora as correcções acertadas por que já passou, depois de feitas críticas certeiras e duras.

Os pirilampos “cyborg” que agora convivem com os humanos que queiram desfrutar do Terreiro do Paço durante a noite, não emitirão luz por via de qualquer ritual de acasalamento, ou por reacção subcutânea ou oxidação mais ou menos estranha, mas sim por carregamento via luz solar. Assim, depois de devidamente carregados durante o dia, terão depois pilha suficiente para de noite demarcarem os losangos em betuminoso híbrido com que cobriram a praça (já cor de alcatrão, aliás).

Mais importante: depois dos periscópios candeeiros e dos projectores aerodinâmicos sobre a passadeira de peões defronte ao Cais das Colunas, o Terreiro do Paço passa a dispor de um novo atractivo turístico de iluminação pública, que ultrapassa a dimensão salomónica e maçónica defendida por alguns e que constituirá mais-valia turística incomensurável. Lisboa passa a poder rivalizar com os trilhos andinos de Nazca, ou os britânicos “crop circles”, enquanto destino místico. É que à noite, estes pirilampos mágicos, na verdadeira acepção da palavra e fruto do “choque tecnológico”, ou melhor, aqueles que tenham pilha suficiente para acenderem até de madrugada, vistos do espaço constituirão a mais bela das pistas de aterragem para O.V.N.I., serão motivo de divulgação frenética inter-galáctica. O Terreiro do Paço passa, assim, a dispor de uma mais valia até agora nunca explorada, uma providencial fonte de receitas turísticas com direito a figurar até na série televisiva “O Mundo Misterioso de Arthur C. Clarke”.

Só é pena que, por força da ondulação do piso da placa central, a sinalização seja impossível de vislumbrar ao plano do chão, pelo que ao campo de visão do peão visitante antes pareçam luzes intermitentes enviando sinal S.O.S. a quem de direito, para que acabe com tanta invenção no martirizado Terreiro do Paço; numa requalificação que podia ter sido simples, estética e eficaz, e não esta manta de retalhos a que já muito poucos chamarão “projecto”.




In Jornal de Notícias (7.10.2010)

1 comentário:

Anónimo disse...

Há luzecus no Terreiro do Paço e ideias luminosas na câmara municipal de Lisboa.