terça-feira, agosto 09, 2011

Como nos vêem

NESTA magnífica obra (editada já este ano), o autor descreve, sem grandes erros (e a maioria deles deve-se, porventura, à tradução do Inglês), como somos vistos pelos outros. Refere o que gosta (a paisagem, a gastronomia, a hospitalidade, alguns períodos da nossa História) e o que não gosta - ou o espanta.

Dentro da 2ª categoria, refere:

... como deitámos pela borda-fora os dinheiros das Índias (primeiro), do Brasil (depois) e da CEE (já recentemente);
... o acordo ortográfico (75% das alterações foram impostas pelos brasileiros - e não por Portugal, o país da língua-mãe);
... a destruição urbanística - do Algarve, mas não só...
... o poder dos Chicos-espertos (refere o caso de uns sobreiros abatidos à má-fila...)
... o Ministro da Defesa que, quando saiu, levou consigo 60 mil fotocópias de documentos do seu ministério sem que ainda hoje alguém protestasse.
... a Justiça inoperante, que pode levar 20 anos para julgar um caso. O da Casa Pia já vai em 5, e não se lhe vê o fim.
... a corrupção - que bloqueia a sociedade portuguesa e que, juntamente com a justiça lenta, é uma das causas que afasta o investimento estrangeiro. Não conhece o nome de um único corrupto preso, e estranha que tenha sido o próprio PS quem mais se tem oposto a que seja criminalizado o enriquecimento ilícito.

No que toca ao português-médio, o autor nota que:

... tem uma baixa auto-estima (é o primeiro a dizer mal de si mesmo - vejam-se as anedotas em que entra "um português");
... tem um ar triste (em comparação com o brasileiro), a que o
fado dá o tom;
... prefere pensar que "não há-de ser nada" (a propósito de não haver planos de emergência para catástrofes como a de 1755) ;
... não é dado a pensar a longo prazo («Só penso nos problemas à medida que eles aparecem» - como disse António Vitorino na TV);

... deixa tudo para o último dia;
... não percebe que o "desenrascanço" é um defeito e não uma qualidade nacional;
... é incapaz de chegar a horas a uma reunião, mesmo de negócios do seu interesse;
... é capaz de se gabar em público que comete o crime da fuga aos impostos;
... acha que a culpa do que lhe corre mal é sempre dos outros (sejam acidentes de trânsito ou a economia);
... é capaz de estacionar em 2ª fila ou em cima dos jardins e dos passeios mesmo desnecessariamente - só pelo gozo de violar a lei;
... cria leis de excepção quando não é possível fazer cumprir a actual (cita o caso das touradas de morte de Barrancos);

... a 1ª coisa que faz quando vai a um serviço público (repartição, hospital, etc) é ver "se conhece lá alguém que dê um jeitinho";
... não condena a cultura da "cunha" (acha que passar à frente dos outros, num concurso, p. ex., é normal e aceitável) ;
... reza para que venha o Papa e as multas de trânsito sejam amnistiadas, o que sucede regularmente e aos milhões;
... apesar de avesso, por natureza, a cumprir regras, o português gosta da autoridade (mas só para os outros). «Haja quem meta isto na ordem! Faz falta um outro Salazar!», são frases que se ouvem com frequência;
... vive obcecado com "o que dizem de nós lá fora" (quando, afinal, a maioria dos estrangeiros julga que Portugal é uma província de Espanha);
... aceita, como normal, que um médico chegue com 2 horas de atraso (ou nem apareça...) e nem sequer peça desculpa aos doentes.
... sofre de um racismo moderado/envergonhado («Não tenho nada contra os brasileiros, mas...»);
... a incapacidade de tomar decisões "de uma vez por todas" (as voltas e reviravoltas do TGV - que ora tem 5 linhas, ora não tem nenhuma - e nem se sabe onde passará, se alguma vez se fizer...).
.
No entanto, o autor adora viver em Portugal. Casou com uma portuguesa, e não tenciona ir-se embora tão cedo, pois acha que, a par das coisas verdadeiramente boas, todo este caos que nos envolve tem o-seu-quê de bizarro, de único, de primitivo. A filha dele, que já nasceu cá, dá-se mal com a sociedade inglesa, quando lá vai: "demasiado organizada para os seus gostos e hábitos"...

5 comentários:

Anónimo disse...

A filha do autor que vá agora a Londres (ou Birmingham), provavelmente não achará a Inglaterra demasiado organizada...

Carlos Medina Ribeiro disse...

Pois... E os 'hooligans' portugueses parecem anjinhos ao pé dos seus confrades ingleses!

Anónimo disse...

e por que razão nos comparam com os brasileiros??

Carlos Medina Ribeiro disse...

Em qualquer estudo sobre a portugalidade, é inevitável a comparação dos portugueses com os ex-colonizados (neste caso, com os brasileiros), na medida em que se trata de nações que nasceram de outra (em termos administrativos, culturais, linguísticos, etc.).

É precisamente o facto de as ex-colónias trilharem caminhos novos (e próprios) que torna fascinante a comparação entre essas nações.
Neste caso, o autor compara a alegria do povo brasileiro com a soturnidade do português.
Pode ser uma generalização, mas não anda longe da verdade, pois não?

J A disse...

Uma apostinha que se Portugal tivesse tudo isto e o clima da Escandinávia....o amigo Hatton já se tinha pirado há muito.