Vivemos nos discursos como o peixe vive na
água.
Construímos e articulamos palavras e damos
sentido à realidade, aos sentimentos e à fantasia com esses.
Mas estamos a chegar ao fim, novas lógicas de
poder, que também passam pela ignorância dos discursos e da sua construção com
a ciência e o conhecimento começam a introduzir-se em todos os sectores da
sociedade. A simplificação gerada por novos sistemas de comunicação, governar
por 200 digitos, dar a mesma valia à religião e à ciência, ignorar a ciência
quando essa se opõe a lógicas económicas, ignorar o peso da palavra quando a
imagem, forjada pelo ecrán faz de espelho da realidade.
Vivemos tempos em que os discursos se vão
esvaziando, como os mares aumentando e alterando as suas correntes e
temperatura e o degelo vão perturbando os ciclos atmosféricos e os peixes vão
tendo cada vez mais dificuldades em viver, também porque as palavras em que se
baseia a sua vida está poluída, degradada alterada por padrões de
desenvolvimento que não tem consideração pelos discursos.
Vivemos nos e dos discursos mas cada vez mais
enfrentamos muros na nossa interligação, na construção da sociabilidade e da
suficiência.
Temos que resistir inventando novas formas de
comunicar, dando a nossa voz e empenho sempre que podemos e não calando a
palavra que vai, por razões diversas sendo cada vez mais, estando cada vez mais
isolada.
Tenho, ultimamente, falado sobre alterações
climáticas, energias renováveis, nuclear, petróleo, abelhas, biodiversidade,
sobre o que comemos e como, sobre cultura e como manter esta é importante,
porque ela é o discurso estruturado em formas diversas e vivas.
Vivemos nos discursos como o peixe vive na
água.
Mas estamos como esses a sufocar.
Porque os modelos de crescimento conduzem-nos
a becos sem saída de silêncio e incompreensão. Porque a organização das nossas
sociedades e a sua concentração reduz os espaços de cidadania. Porque o domínio
de novas tecnologias em vez de nos ter dado mais capacidade e alargado o espaço
da civilização tem vindo a reduzir a humanidade ao manipular digital onde a
comunicação se dispersa sem sentido.
Temos que lutar para manter os discursos
vivos, temos que dar ar, dar mais ar aos nossos pulmões e romper os bloqueios,
por onde os rios das nossas palavras possam encontrar continuidade e criar.
Plantar uma couve, caminhar por uma várzea ou
ao longo de um rio, participar numa tertúlia, assinar e envolver a nossa
palavra num acto, acarinhar o vivo e reconhecer o seu papel na formação social,
são momentos onde o discurso pode romper. Por aqui e por ali.
Hoje vivemos tempos difíceis para os
discursos, vivemos tempos difíceis para a espécie que os constrói e com esses a
realidade, que a partir desses emergiu.
Não deixemos os discursos acabar, mantenhamos
o olhar atento, o ouvido à escuta, continuemos a cheirar as flores e a sentir o
vento e saboreemos a realidade, com a língua que a faz, ou pelo menos a faz
para nós.
É esse, é também esse o papel dos educadores,
que somos todos os que não deixamos morrer o discurso!
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