quinta-feira, setembro 02, 2010

Expulsões

Quando surge uma reconhecida incapacidade dos governos para, só por si, darem resposta eficaz aos anseios dos cidadãos, surgem sempre novos pretextos para o aparecimento de populismos de sinal diverso (tantas vezes com origem nos próprios governos) e de movimentos contestatários extremistas ou simplesmente demagógicos

A expulsão e perseguição a que se assiste no Mundo Ocidental (que reclama como património os Direitos Humanos) de cidadãos vindos de outros países é um retrocesso civilizacional. Trata-se do mesmo Mundo Ocidental que assiste a tantos dos seus migrarem para países emergentes em função da crise.

Tudo isto é tanto mais chocante quanto se impõe a reinvenção de uma sociedade mais equitativa e solidária, mais baseada em valores éticos, mais frugal nos consumos materiais. Em suma, muito mais centrada no outro.

Como teremos mesmo de mudar de paradigma, este é o momento certo para fazer o que é certo, mas isso seria provavelmente esperar muito da natureza humana, no geral.

Acresce que as crises relegam sempre estas questões – que são afinal estruturais – para segundo plano.

Não esquecendo a existência de situações problemáticas a requererem respostas estruturadas em valores, o que está em causa é o que é ser humanista nos dias de hoje. Estão inequivocamente em causa valores da dignidade Humana, e a verdade é que se assiste a uma inversão desses valores, sendo os seres humanos vistos como um recurso a gerir num contexto de organização económica desregulada, encarada como um fim em si próprio.

O horror e o sofrimento de quem é obrigado a partir – de novo – apenas porque não é ‘útil’, designadamente como força de trabalho, deviam suscitar, pelo menos, um agitar da nossa responsabilidade colectiva, quando não dos nossos deveres humanitários, que os temos.

É tão mais fácil ser intolerante ou indiferente, mas como a História demonstra, a intolerância e a indiferença pagam-se muito caras (cedo ou tarde) e, sendo um lugar comum, é verdade que a violência tem, em regra, como resposta, maior violência.

Agora, aceitar o ser humano reduzido à condição de matéria-prima ou fazer depender o seu estatuto da sua utilidade, é aceitar que o Estado de Direito está mortalmente atingido. O Estado de Direito, na sua verdadeira acepção, só pode assumir certos valores como absolutos ‘sacralizando’ os Direitos Humanos.

O problema é que, no fundo, parece que não aprendemos nada.




In Correio de Manhã

1 comentário:

Anónimo disse...

Sarkozy teria como resposta um muito maior risco de violência se tem actuado contra os árabes.

Mas isso ele não fez, compreende-se bem porquê.