Falo, propositadamente, n'Os Donos de Portugal, um livro de Jorge Costa, Luís Fazenda, Cecília Honório, Francisco Louçã e Fernando Rosas, há meses editado pela Afrontamento, cujas revelações são tão surpreendentes que explicam o silêncio estremecido da nossa imprensa. Em cem anos de poder económico, meia dúzia de famílias, que se cruzaram e entrecruzaram através de laços matrimoniais, forçados pelas estratégias do mando e do poder, continua esse edifício de ambivalências e contradições transformadoras de uma nação numa sociedade em comandita.
Quando Passos Coelho fala do medo instalado na sociedade portuguesa, devia aclarar as origens desse medo. E quando Sócrates insiste em que é socialista, a boca devia encher-se-lhe de areia, como na parábola bíblica. Há algo de marginalidade e de despudor no discurso que enche as televisões, as rádios e os jornais. Uma leitura, mesmo apressada, induz-nos a perceber que, na generalidade, essa retórica é não só abstrusa, por ignorante, como conduz a posições potencialmente perigosas.
Enquanto Sócrates é uma combinação de grotesco, no qual o desvario inventa o seu próprio infinito, Passos Coelho é um homem perigoso pelo que afirma e, sobretudo, por aquilo que involuntariamente dissimula. Com as ameaças que faz de "mudar" tudo, inclusive o que não é necessário alterar, demonstra uma inconsciência muito próxima do furor incontrolável de quem acaba por revelar as suas dualidades. Passos não é perigoso porque o queira ser, haja Freud!, é-o porque não sabe que o é. E Sócrates prossegue na doida cruzada de omissões e de fabulações intermináveis: um ser que confunde paixão com insanidade. É ou não é de ter medo do estranho destino que nos ensombra, com qualquer destes dois a mandar? A mandar, é como quem diz, bem entendido. A mandar aquilo que os outros mandam.
O carácter relacional do poder está a modificar muitos dos valores e dos princípios que formaram o carácter dos homens e dos povos. A servidão, engendrada por diversos regimes e sistemas, está a fazer o seu caminho pausado e eficaz. Nada do que foi será. E o que será pode muito bem suportar um tirano a posar de democrata.
Eles andam por aí.
4 comentários:
Bonito, bonito era Portugal sair do Euro.
Abóbora.
Mais bonito ainda era voltar a erguer-se o muro e a cortina.
Pena que o povo parece não querer...
Que desassombro. Muito bom.
Desassombro, na casa da câmara? Que desleixo municipal.
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