Desta vez, passados mais de 200 anos sobre a construção daqueles órgãos (do Evangelho, da Epístola, do Sacramento, de São Pedro d'Alcântara, da Conceição e de Santa Bárbara), cada 3 por Machado Cerveira ou por Fontanes, houve engenho e arte para, em 11 anos e com paciência e abençoada teimosia, tornar possível um sonho de gerações: pô-los a tocar todos ao mesmo tempo, com alguma da música composta especialmente para tal. A adesão do público foi total, com enchentes jamais vistas pelas anfitriãs de mármore espalhadas pela basílica.
Estão, por isso, todos de parabéns, não só os organistas e o coro que tocaram e cantaram na ocasião, mas sobretudo quem porfiou e conseguiu que esta ocasião fosse possível:
O Estado, que se portou bem (parabéns ao Ministério da Cultura, à comissão de sábios por ele constituída e à ex-directora de Mafra, em especial). O Barclays, que honrou os mecenas da Renascença. E o mestre organeiro Dinarte Machado, que não cabia em si de contente e com razão.
Mas, agora que as celebrações se foram, é bom que não voltemos a esquecer-nos dos órgãos de Mafra e não abandonemos os seus tubos e os seus foles ao pó, à humidade e às traças. É preciso um programa de concertos e cerimónias que os mantenham activos. A crer em notícias vindas a público tal parece vir a ser uma realidade a curto prazo, ainda bem. Mas é preciso mais.
Há alguns anos, em Lisboa, o restauro dramático de um dos melhores órgãos do país, o da Igreja de São Vicente de Fora (1765), pôs a nú a ausência de uma estratégia de restauro, manutenção e promoção dos nossos órgãos históricos (e só Lisboa tem quase meia centena). Falou-se na altura (1994), tal como agora por causa de Mafra, da instalação de uma escola de organaria no Convento da Graça. Hoje, para esse mesmo convento procura-se um hoteleiro. O episódio mais caricato dessa indiferença pelo valiosíssimo património que são esses órgãos, acontece também em Lisboa, com desmantelamento do fabuloso órgão dos Paulistas da Calçada do Combro, que se mantém nesse estado lamentável, imagine-se, porque a CML não paga a última tranche do que ficou de pagar, segundo o protocolo de recuperação da igreja oportunamente firmado.
E ali estão milhares de peças por montar. Até quando?
Por isso é bom que o tal “programa cultural” não fique, mais uma vez, por uma carta de intenções que “ministros de turno” ora invocam ora arquivam. É preciso legislar e proteger e definir regras para os órgãos históricos, evitando-se barbaridades. Eventualmente, um Observatório. Fica feita a sugestão.
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