Brincando aos aeroportos
Félix Rodríguez de la Fuente uma referência da
ecologia e da protecção da natureza ibérica era um falcoeiro. Desde os anos 60
que promoveu o afastamento de aves dos aeroportos com os seus falcões, o que
hoje se faz em grande parte desses.
As aves são causadoras de muitos problemas e
até acidentes, cada vez mais frequentes,
devido ao aumento do tráfego aéreo.
Desde logo, dado que a avifauna é muito
resiliente será um grande problema e um enorme risco um aeroporto numa zona muito
sensível do estuário do Tejo, para a qual não haverá falcões que cheguem....
Não têm sido muito referidos os custos
brutais, que todos pagaremos, da opção pelo aeroporto no Montijo.
Esses não são só relacionados com a avifauna,
que é desde logo um dos elementos que
merecem saliência. São referenciadas muitos milhões de aves, numa zona
classificada como de Zona Protecção Especial, além de ser Zona Importante para
as Aves, segundo a Bird Life Internacional.
Os custos desta opção, obviamente, são
desconsiderados porque de difícil contabilização no que se refere à natureza,
recursos animais e vegetais, que suportam a vida numa das zonas húmidas mais
importantes do nosso país, a Reserva Natural do Estuário do Tejo, mas devem, ou
deveriam ser considerados, seja em prospectiva no que se refere às
características geo-morfológicas e ás suas potenciais consequências,
nomeadamente pelo facto de este aeroporto estaria em zona de alto risco sísmico
acrescido pelas dinâmicas das alterações climáticas.
Questão que é completamente escamoteada na
proposta deste novo aeroporto, como se fossem uns pozinhos que se joga para
debaixo do tapete.
É um facto que os transportes aéreos ainda
estão fora das emissões consideradas pelos Acordos de Paris sobre o Clima, mas
não é menos verdade que as suas emissões atingem proporções significativas e
não pode ser previsível a continuação do seu aumento ou sequer a sua manutenção
aos níveis actuais. Terão que ser integrados numa análise global e penalizados,
fortemente, com as consequências daí resultantes.
E, não tendo tal sido pensado pelos
proponentes do projecto, e os seus beneficiários, nem equacionado no Estudo de
Impacto Ambiental, que como sabemos é feito por encomenda dos interessados,
ficamos a pensar se não estaremos perante mais um aeroporto a construir numa
espécie de paúl entre montanhas...isso jamais, jamais....ou seríamos todos
otários.
Mas os nossos governantes continuam a brincar
aos aviõezinhos... Este aeroporto faz lembrar a nossa nunca construída central
nuclear, andou por Ferrel, Freixo Espada à Cinta, Mira, Milfontes, Tancos,
Alqueva e mais 5 ou 6 locais, muitos estudos, todos com premissas erradas,
muito dinheiro a circular, até em malas que vimos, e hoje temos renováveis a
fornecerem mais de 50% do país e ainda mais ambição.
Pois este aeroporto já andou pelo Poceirão,
Rio Frio ( que ainda manteve uma comissão a jantar sobre esse estudo até
recentemente, porque alguém nunca a dissolveu!) e a Ota, não esqueçamos o seu paúl!
E agora o Montijo, sem esquecer Alcochete onde temos, sem dúvida as melhores
condições para complementar a progressiva redução da Portela.
Mas tudo isto deveria exigir, exigir mesmo uma
avaliação ambiental estratégica, com pés e cabeça, em vez de mandar brincar aos
aeroportos.
Os estudos sobre a evolução do tráfego aéreo
são baseados em fumo, que as alterações liquidarão, falta uma avaliação das
infraestruturas necessárias para dar
maleabilidade a uma adequada ocupação do território, enquadrando a travessia
ferroviária e o... elefante branco, mais um, que é o aeroporto de Beja, que tem
que ser considerado em complementaridade.
O aeroporto de Lisboa não é só o aeroporto de
Lisboa, La Palisse não diria mais, mas um projecto nacional, sem desconsiderar
o do Porto, que também deve ser considerado no quadro de uma decisão que seja
iluminada por uma avaliação global, que deve integrar, em termos de recursos
financeiros todo o sistema aéreo ( não é que vemos pulular por todo o lado
aeródromos?), mas também as ligações marítimas (cargas) e ferroviárias.
Por razões que não são difíceis de imaginar,(
todos temos essa poderosa e capaz de sumir muitos aeroportos...) alguém agora,
curiosamente à beira de eleições... decidiu atirar dinheiro, ou melhor este
projecto para o ar.
Mas os lodos abeiram o cais, um aeroporto com
pistas sobre estacas nem nos magníficos desenhos de Shuiten (excelente
desenhador de Bandas Desenhas belga) aguenta a erosão do tempo. Este do Montijo
se houver bom senso não verá o horizonte, que continuará sem falcões, que esses
irão ser utilizados onde a economia, o ambiente e uma boa gestão, integrada do
sistema global de transportes o indique.