quinta-feira, dezembro 17, 2009

A Agenda

Estes dias políticos confrontam-me com um trecho de Séneca, em ‘Cartas a Lucílio’: "Convence-te de que as coisas são tal como as descrevo: uma parte do tempo é-nos tomada, outra parte vai-se sem darmos por isso, outra deixamo-la escapar. Mas o pior de tudo é o tempo desperdiçado por negligência. Se bem reparares, durante grande parte da vida agimos mal, durante a maior parte não agimos nada, durante toda a vida agimos inutilmente."

O Tribunal de Contas ‘chumba’ os contratos de cinco concessões da Estradas de Portugal. O Tribunal de Contas ‘chumba’ a criação da Central de Compras para o Serviço Nacional de Saúde, entendendo que carece de fundamento legal e que não foi apresentado um estudo sobre as vantagens da centralização das compras.

A Comissão Europeia, por seu turno, entende que a adjudicação directa dos computadores ‘Magalhães’ constitui uma violação do direito comunitário.

Estas decisões, postas em causa pelo Tribunal de Contas e pela Comissão, são decisões tomadas ao mais alto nível político e administrativo, e dizem-nos respeito a todos, quer na mobilidade, quer na saúde, quer na educação. É por isso que há situações que não servem a ninguém, e estas são paradigmáticas, porque sempre implicam gastos para as entidades públicas e para as empresas e prejuízo para os utentes. E além disso nós precisamos que as instituições funcionem e bons projectos se materializem. Para isso há que prepará-los bem, fundamentadamente e integralmente e também para isso existem estruturas administrativas.

Mas neste contexto de horrível desemprego (para não falar no subemprego e nos salários e pensões mais baixos), de endividamento e do pelo menos aparente desnorte do Governo na condução das coisas públicas, discutem-se agora eleições antecipadas e regionalização; condições de governabilidade e reptos institucionais.

Mas a quem interessa esta agenda política tão alienada da realidade? A quem interessa a intriga palaciana constante, também constantemente acompanhada por um discurso pouco polido, para não dizer desastradamente vulgar, na pior acepção do termo? Com cerca de 40% da população a atingir níveis de pobreza, não fora a ajuda pública. As últimas sondagens dizem tudo.

Chega de ruído, de desculpas, que o País precisa de trabalho, a começar pelo Governo.

Mas, se nos rodearmos de pequenos calígulas, a situação só propiciará mesmo a corrupção económica e moral desta nossa sociedade.




In Correio de Manhã

1 comentário:

Ulisses Martins disse...

A corrupção moral é o corolário da situação governativa. Escutando a sessão de hoje na Assembleia da República, ficamos com a certeza que já estamos a bater no fundo, se é que não passeamos já por túneis obscuros e bafientos.