Por outro lado, à medida que se vai folheando o texto do dito, convenientemente extenso, a sensação é de enfartamento perante a clara disfunção semântica. Desde logo o entendimento de Baixa Pombalina: sendo São Paulo o local por excelência para uma salvaguarda da herança de Pombal – ainda por lá há mansardas de Mardel, cozinhas genuínas, etc. -por que não consta ele dos limites físicos do Plano? Mais, compreendo que os nossos decisores, com fome de resultados rápidos e em força, caiam na tentação de ignorar uma evidência: sempre houve um elevado custo de oportunidade para quem pretenda habitar a Baixa. Dito de outra forma: quem o queira sabe à partida que terá na Baixa o que talvez não tenha noutro local, e o contrário disso. Um apartamento na Baixa poderá implicar abdicar-se do automóvel e de modernidades só possíveis com a adulteração radical dos edifícios (janelas nas empenas, elevadores nas caixas de escada, tectos falsos com ar-condicionado, etc.). Mas poderá propiciar benefícios incomensuráveis: centralidade histórica e cultural, tectos altos e interiores cuidados se restaurados, cruzamento de gerações e de estratos, etc.
Resumindo: a Baixa é a Baixa e como ela não há nenhuma. Por isso é essencial que a tal Salvaguarda não se confunda com tanto “bite” e salvaguarde o que é realmente autêntico, não se prostituindo como o vizinho Chiado onde a “reabilitação” a betão armado e indiscriminadamente segue como nunca, para gáudio das estatísticas e dos defensores de uma Lisboa estandardizada, por alto, por dentro e por trás. É, por isso,tremendamente oportuno que nesta fase se pense diferente:
Que a candidatura à UNESCO não seja um verbo-de-encher mas um sinal de pragmatismo. Que a pedagogia do promotor, a partir de casos de sucesso de reconstrução pombalina e efeitos de demonstração subsequentes, se sobreponha à do laxismo e do lucro fácil, de modo a que sejam os projectos a adaptar-se aos edifícios e não o inverso. Que haja urbanismo comercial a sério, protegendo o que há a proteger e formando a mudança no que há a mudar. Mais espaços pedonais, mais oferta cultural. Menos poluição, menos elementos espúrios. Mais: menos do mesmo.
1 comentário:
A notícia até pode ser boa, a questão é conseguir acreditar nela.
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