quinta-feira, dezembro 02, 2010

Mercados

Fique descansado, caro leitor: não lhe venho falar dos tais “mercados”, tenebrosos e “vampirescos”, com que nos vêm azucrinando os ouvidos nos últimos meses por causa da malfadada crise financeira que, cá para mim, por cá até tem décadas e da qual, a bem dizer, nunca chegámos verdadeiramente a sair, ou saímos? Muito menos esta crónica tem que ver com qualquer reclamação a propósito de calças de ganga Levi’s compradas como genuínas na banca da D. Pancrácia na feira de Domingo e que à primeira lavagem ficaram desbotadas. Nada disso. O motivo por que escrevo sobre mercados é apenas porque gosto especialmente de cinco dos mercados municipais de Lisboa e custa-me ver o estado por que se arrastam, uns, e outros que sendo o que são podiam ser ainda mais.

Começando pelo histórico Mercado da Ribeira, letárgico desde há anos e que viu finalmente abrirem-se-lhe novos horizontes por via do recente acordo estabelecido entre a CML e uma conhecida revista do “acontece em Lisboa”, tendo como objectivos revitalizar o edifício, interagir com a “movida” de Santos & Cia., atrair novos públicos. Oxalá que os prognósticos se verifiquem e que a médio, longo prazo, possamos ter uma Ribeira “à la” Covent Garden. Com arte e engenho será não só possível como será tónico a toda a zona de São Paulo, que bem o merece.

Outro dois há que por serem de tal maneira “unha e carne” com os respectivos bairros, seus moradores e visitantes, dificilmente hão-de padecer de mal incurável nas décadas mais próximas, por muito que sejam ameaçados com cadeias de supermercados e hipermercados, os debochem com T-shirts dependuradas ou outros artigos de que se possam envergonhar, e que nos digam que sem estacionamento automóvel com fartura não há mercado que resista. Desde as bancas das zonas centrais aos cafés e restaurantes, lojas e serviços distribuídos pelos espaços exteriores, alguns deles altamente especializados em nichos de mercado tão variados como socas suecas ou guloseimas especialíssimas, a verdade é que tanto o mercado de Alvalade como o de Campo de Ourique aparentam respirar saúde por todos os poros. Que assim continuem e os deixem continuar.

Finalmente, os dois mercados modernistas tardios de Arroios (finais da década de 30) e do Forno do Tijolo (anos 50), cada qual de sua traça e funcionalidade próprias, mais ou menos ultrapassadas, já, mas que podem ser devidamente potenciadas, venha daí um projecto, ou melhor, venham daí ideias capazes disso mesmo mas que não passem pela sua demolição e conversão dos subsolos em estacionamento subterrâneo para construções novas à superfície. Não colhe a desculpa esfarrapada de que é por causa dos popós não terem lugar para estacionar que estão como estão. Além disso Lisboa não se pode dar ao luxo de os deitar fora.




In Jornal de Notícias (2.12.2010)

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