Na discussão sobre o financiamento da Carris há duas coisas que aparecem confundidas:
A primeira é a necessidade do financiamento público dos transportes colectivos (chamemos-lhe subsídio ou indemnização compensatória que é o mesmo) a outra é a questão de saber quem deverá pagar.
Quanto à necessidade de financiamento público não tenho dúvidas: nas cidades de hoje são tantas as externalidades positivas do uso do transporte público em relação ao privado que os transportes públicos poderiam ser gratuitos. E se uma portagem reduzir a congestão das vias de Lisboa acho que todos ganhamos mesmo os que vão pagar.
Outra é a questão de saber quem suporta o financiamento: sem que haja uma ligação imediata e directa entre despesa municipal e imposto municipal haverá sempre excesso de despesas, corrupção e desperdício.
Por isso os transportes colectivos de Lisboa devem ser pagos por Lisboa os transportes colectivos do Porto devem ser pagos pelo Porto.
Serão sempre pagos pelos contribuintes: mas se forem pagos de forma indirecta vamos ter sempre a pork barrel. A despesa inteiramente inútil, obtida pelo eleito local no pressuposto que sua circunscrição ganha alguma coisa (ainda que pouco) e que ainda que seja pouco produtiva não faz mal porque quem vai suportar os custos são os outros contribuintes.
J.L. Saldanha Sanches
9 comentários:
Pois claro, se os jornais são gratuitos, não há razão para os transportes públicos não o serem. Viviam da publicidade e estava o assunto resolvido.
100% de acordo com o post.
E exactamente por haver enormes externalidades positivas dos transportes públicos e enormes externalidades negativas dos automóveis (que podem chegar quase aos dois euros por quilómetro e por automóvel), é que defendo que as portagens matariam dois coelhos de uma cajadada só: as externalidades e o financiamento dos transportes públicos.
Sim, claro, a "gamela do porco" não é a melhor solução, longe disso...
A participação do Poder Local (e, futuramente, também do Regional) no financiamento dos sistemas de Transporte Colectivo metropolitanos está na base da criação das famosas «Autoridades Metropolitanas de Transportes», de Lisboa e do Porto.
O problema é que estas duas pomposas «Autoridades», apesar de já terem Comissões Instaladoras desde há mais de três anos (tendo aliás a de Lisboa sido, logo de início, presidida pela depois Vereadora e mais tarde ainda Presidente da Comissão Administrativa da C. M. L., Marina Ferreira), ainda não vivem na realidade, mas apenas no papel. Por que será?...
Em todo o caso, a questão (fulcral) do financiamento dos Transportes, um dos maiores engulhos ao arranque das (nado-mortas) «Autoridades», está longe de prever essa enormidade que seria o financiamento INTEGRAL das Empresas Públicas de Transportes por parte dos orçamentos camarários de Lisboa e Porto. Se por aqui ainda estamos nesta fase...
Miguel Carvalho,
o problema, infelizmente, não se resume às externalidades. Experimente não saír das "internalidades", documente-se e depois faça "reset" às suas opiniões, sem precisar de alterar nenhum pressuposto do seu raciocínio...
Quanto às tais portagens urbanas, eu sugiro uma proibição total de entradas de veículos particulares de "forasteiros" em Lisboa (excepto em caso de emergência). Para grandes males, enormers remédios! Já pensou nisto?
Ah, pois claro, depois faltariam as receitas para aplicar nos Transportes Públicos...
Mas talvez também estes deixassem de ser necessários pois, não havendo tráfego, todos passaríamos a poder andar a pé, ou de bicicleta...
Ficava mais um grave problema definitiva e completamente solucionado: o da POLUIÇÃO!
Desculpe A. Castanho, não percebi o seu comentário das 17h05
Miguel Carvalho,
pelo que eu depreendo das suas opiniões, somos capazes de ter os mesmos ideiais e valores. O problema que se coloca é apenas de conhecimento objectivo da realidade.
O que eu pretendi transmitir-lhe foi que, sim senhor, seria óptimo que houvesse uma grande, maciça mesmo, transferência modal de tráfego de passageiros do transporte individual para o colectivo. Teria efectivas vantagens em termos das chamadas externalidades do transporte, tudo bem.
Mas não podemos é forçar isso de uma forma administrativa, nem muito menos de uma forma fiscal, ou económica (digamos que por meio das tais portagens urbanas), pelo menos enquanto a rede de transportes públicos de Lisboa não constituir uma alternativa viável para a actual PROCURA de passageiros. Explicando melhor: veja o exemplo do DIA SEM CARROS.
Se em todos os dias fosse assim (e poderia muito bem sê-lo, desde que a Câmara o deliberasse), instalar-se-ia simplesmente o CAOS na Área Metropolitana de Lisboa, pois na realidade a esmagadora maioria das deslocações pendulares (casa-trabalho, ou casa-estudo) que se efectuam NÃO TÊM ALTERNATIVA FIÁVEL em termos dos Transportes Colectivos.
Sem poder recorrer ao automóvel particular, a triste realidade é que o PIB da A. M. L. cairia por aí abaixo de uma forma CATASTRÓFICA!
Por isso digo que, antes de argumentarmos com as consequências nocivas do insuficiente desempenho do sistema de transportes em termos das suas externalidades, há que estudar a fundo e inverter, de uma forma sustentável, as condições de CRIAÇÃO DE PROCURA DE TRANSPORTE na Região lisboeta.
E isso passa, em primeiro lugar, por um novo paradigma de ocupação do solo e de planeamento urbano cuja tradução política está na seguinte fórmula: quem decide sobre os Transportes, tem de decidir igualmente sobre 1) as operações urbanísticas (sobretudo Planos e Loteamentos) e 2) sobre as transformações de uso do edificado!
Por isso é que a solução NÃO PASSA pelas Autoridades Metropolitanas de Transporte, as quais se limitarão a decidir sobre o sistema de transportes! Enquanto as Câmaras poderão continuar a decidir onde ficam os centros comerciais, as "novas urbanizações", os "parques de escritórios", as Escolas, os Centros de Saúde, etc., etc.!
Sabe como é na Europa? Os órgãos políticos metropolitanos (executivo e legislativo) têm SIMULTANEAMENTE as responsabilidades pelo Planeamento Urbano e Ordenamento do Território e sobre o planeamento, gestão e exploração dos seus sistemas de transporte!
E é (sobretudo) por isso que as Cidades europeias são como são...
Cumprimentos,
Ant.º das Neves Castanho (especialista em planeamento).
Caro A.Castanho
Estamos de acordo quanto à necessidade de ambas as decisões de planeamento serem tomadas conjuntamente. Imagino que estaremos de acordo quanto à necessidade de elas serem tomadas a um nível supra-municipal. E de facto parece-me que estaremos de acordo em muitas outras coisas.
Quanto ao resto
- Vejo que não aborda o problema do financiamento, que era o tema do post. Sem contar com o financiamento, é fácil resolver problemas.
- Eu não acredito que as portagens fossem levar a uma mudança modal maciça no curto-prazo. Não foi o que aconteceu em Londres, nem foi o que aconteceu em Lisboa com a política de parquímetros.
- A limitação número 1 dos transportes públicos dentro da cidade (e são esses que estariam mais à prova) é a velocidade dos autocarros. Uma redução do trânsito levaria obviamente a um aumento da velocidade e da frequência. A capacidade seria assim bem maior com as mesmas infraestruturas que temos hoje.
- Por favor, o dia-sem-carros não serve de exemplo para nada. Neste dia-sem-carros, os TP nem sequer foram autorizados a circular no centro! Obviamente que isto traz problemas. E estamos a falar de uma dia de excepção, sem criação de hábitos. É como olhar para os números do trânsito no primeiro dia em que uma via é aberta, e concluir daí que ela não serve para nada, porque ninguém passa lá.
- As portagens durante as horas-de-ponta têm ainda duas grandes vantagens: dissuasão de pessoas que realmente não precisam de usar o carro (todos conhecemos casos assim), o que iria melhorar as condições dos que realmente precisam; alteração da distribuição temporal do trânsito, diminuindo a pressão sobre as horas-de-ponta
Caro M. Carvalho,
penso ter sido claro quanto aos financiamentos: a "gamela do porco" não serve!
O financiamento do sistema de transportes metropolitano deve provir, a menos de melhor e mais imaginativa solução (mas que ainda não foi descoberta na Europa...), de três mais uma fontes distintas: as Autarquias, a Região Metropolitana (quando a criarem) e o Estado. Nas percentagens mais adequadas e a acordar honestamente e com transparência - e é fundamentalmente por não ter havido ainda acordo que a Autoridade Metropolitana dos Transportes continua no útero legislativo a aguardar parição concreta. Mais, naturalmente, as receitas directas da exploração.
Como não há ainda órgãos políticos regionais, tirando o simulacro que é a confraria de autarcas designada pomposamente por Junta Metropolitana de Lisboa (cujas legitimidade e operacionalidade são pouco mais do que nulas), o problema sobra para os outros dois níveis interessados na questão, que são o Governo e as Autarquias.
Por enquanto o Governo manda e paga. É a "gamela do porco" (expressão do Autor do Artigo). No futuro o Governo pretende que as Autarquias paguem mas continuem a não mandar (quase) nada e estas pretendem mandar muito e pagar (muito) pouco. E assim lá vamos cantando e rindo há três anos sem avanço DE ESPÉCIE NENHUMA nesta matéria...
Se estiver mesmo interessado em saber qual a minha opinião oficial, indique-me um endereço electrónico que terei todo o gosto em lha enviar.
Quanto à sua confiança no desempenho do sistema de transportes por motivo de uma drástica redução dos volumes de tráfego nas horas de ponta, penso que pode ser uma meta realista, mas apenas a médio prazo. E será preciso trabalhar muito e transformar muita coisa até lá.
Dou-lhe o meu exemplo concreto, que pode repetir-se de mil e uma formas, até à exaustão na A. M. L. . Moro nos Olivais e trabalho na Linha e tenho TRÊS MOTIVOS MUITO FORTES para não usar os transportes colectivos no dia-a-dia: 1º) tenho de levar o meu filho ao infantário e a minha mulher ao emprego de manhã cedo (que não tem alternativa fiável em transportes, dos Olivais para as Amoreiras - de metro são pelo menos dois transbordos!!!!); 2º) tenho de mudar de comboio de Alcântara-Terra para Alcântara-Mar, a pé, e esperar por outro comboio (para além dos outros dois trajectos a pé, relativamente aceitáveis, com bom tempo, entre casa e comboio e entre comboio e trabalho); 3º) tenho carro de serviço e senhas de combustível!
No meu caso, como vê, serão necessárias três condições para que eu considere uma mudança de hábitos: 1ª) prolongamento da Linha Vermelha até ao Saldanha (em curso...); 2ª) ligação ferroviária entre as linhas de Cintura e do Estoril (como aconteceu com as de Sintra e Azambuja) - que não se prevê para breve!; 3ª) substituição da benesse carro por outro tipo de regalia contratual (muito improvável).
Nem mesmo a introdução das tais "portagens urbanas" me afectaria, pois circulo ao contrário dos fluxos dominantes (como já muita gente, aliás)!
Percebe agora a complexidade da situação e a necessidade de adoptar estratégias consequentes a médio e longo prazo, para além de outras medidas mais imediatistas?
Enviar um comentário