Desloquei-me até à frente do comboio, tentando ver se este tinha o número igual ao do bilhete, mas, nada tendo descoberto, decidi aguardar na plataforma, comreceio de ir parar a Torre de Moncorvo. Como a chuva se intensificasse, tentei detectar a minha carruagem, mas nenhuma ostentava o dístico de 1ª classe. Notei finalmente a existência de uma intitulada “Conforto”, um eufemismo para aquilo que buscava.
Uma vez lá dentro, tentei ler um romance, até perceber que a música ambiente impedia a concentração. Olhei o relógio pregado na parede da estação: um papel dizia estar “Fora de Serviço”. Eram 16h49 quando começaram a chegar outros passageiros. Nenhum trazia livros: apenas laptops, revistas e telemóveis. Do mal o menos: às 17h02 já eu atravessava a Lisboa solarenga, convivendo, mal, com os prédios que, ao longo das décadas, se foram construindo. De novo, parámos: era a Gare do Oriente. Olhei a estação desenhada por Santiago Calatrava, paredes-meias com couves galegas em quintais desordenados.
À minha frente, sentou-se uma rapariga de cabelo oxigenado, unhas escarlate escuro e chinelas de salto altíssimo. A certa altura, o seu telemóvel tocou. Ela respondeu: “Sabes, durante estes dias, estive a pensar e decidi candidatar-me a uma bolsa de doutoramento da FCT (Fundação da Ciência e Tecnologia).”Do outro lado, alguém rosnou, ao que, na sua voz esganiçada, ela retorquiu: “Bem sei,mas, que queres, não arranjei mais nada…”Quem não pode ou não sabe, vai para doutorando. Não admira que os estudantes estejam desmotivados e desesperados quem tem de os leccionar.
Maria Filomena Mónica
1 comentário:
Peço desculpa, mas há dias MFM insurgia-se contra um dos quesitos de certo questionário, que incide sobre a predisposição para vestir roupas “vistosas, boémias ou que chamassem a atenção de qualquer forma”.
Afinal, cai na armadilha de criticar o cabelo, as unhas e as chinelas da rapariga.
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