segunda-feira, novembro 17, 2008
«O vale de Alcântara e o interesse público»
In Público (16/11/2008)
José Sá Fernandes
«Devia ter havido concurso público para a concessão do porto, após 2015, mas temos tempo para discutir sem medalhas nem louvores antecipados
1. Traços históricos
Durante mais de 120 anos, foram sucessivamente executados diversos projectos de grande dimensão na zona, sem contudo ter havido qualquer articulação com o sistema ecológico do vale de Alcântara. No último século, ao sabor de cada iniciativa, foi-se escalavrando o sítio e desenvolvendo bairros isolados (Serafina, Liberdade, Cabrinha e Loureiro), desde as linhas de comboio de Cascais e de Sintra (ambas do fim do séc. XIX), passando pelo Caneiro de Alcântara (1943-67), Avenida de Ceuta (anos 60), a Ponte sobre o Tejo (anos 60), extensão do cais (anos 80), Eixo Norte-Sul (anos 90), até ao recente alargamento da ETAR de Alcântara. E o erro, independentemente da valia de cada uma das obras por si, foi sempre o de não se perceber que ao mesmo tempo tinha que se fazer cidade e respeitar a natureza do local, daí as inundações, o caos urbanístico, o trânsito, o afastamento da cidade do rio.
2. As novas obras
Fazer a ligação ferroviária da Linha de Cascais à Linha de Cintura seria, em termos de ambiente e de mobilidade dos cidadãos da Área Metropolitana de Lisboa, um avanço extraordinário, que deve ser ponderado, qualquer que seja o destino do cais de Alcântara. Proporcionar ligações no mesmo transporte entre Cascais e a Expo significará certamente melhor conforto, mais rapidez, melhor mobilidade, mas, sobretudo, menos trânsito na cidade. Pela dimensão e impacto da obra, o seu projecto tem que ser profundamente estudado, mas quanto a isso o LNEC já está a trabalhar, tendo caracterizado toda a zona, como nunca foi feito antes, conhecendo-se agora os terrenos e comportamento das águas.
Quanto ao projecto de alargamento do cais de Alcântara e respectivo aumento de capacidade, sou defensor que continue a existir um porto forte e competitivo em Lisboa e que haja a possibilidade de cargas e descargas de contentores. Para isso existem dois sítios: Alcântara e Santa Apolónia. Ora, porque não há outros nesta margem do Tejo, julgo, salvo melhor opinião, que ambos devem continuar. Mas deve exigir-se ordenamento, limite de altura e eficácia no escoamento. São exigências da própria cidade, não podendo continuar a existir enormes paredes de contentores, como hoje acontece.
Aqui, diga-se que a hipótese de demolição de imediato de duas construções existentes no porto, à frente do cais do Espanhol, merece desde já aplauso, considerando-se que é um ganho que não se deve desperdiçar.
É evidente que qualquer daquelas obras, a poder ser feita, aliás como qualquer outra, como as que estabelecerão o desenho urbano em Alcântara, têm de ser analisadas em conjunto. E por isso mesmo tem de se exigir desde já, ao Governo, que o LNEC faça esse acompanhamento. Até porque, face ao trabalho que agora está a desenvolver, é a única entidade que poderá prever os impactos em cadeia das sucessivas intervenções.
No âmbito destes projectos, há ainda dois aspectos fundamentais a ter em conta: a sua viabilidade económica e a sua discussão com os cidadãos, mas também isto está assegurado no âmbito do processo de avaliação de impacto ambiental em curso.
3. A vereação do Ambiente
Entretanto, após diversas reuniões com as entidades e empresas envolvidas nos referidos projectos - Refer, APL, Liscont, concessionários das Docas e LNEC - conseguiu-se um entendimento que há anos se ambicionava para Lisboa: a necessidade de um estudo articulado e integrado do sistema ecológico do vale de Alcântara.
Aconteceu, pois, um passo de gigante na maneira de pensar e projectar a zona: garantiu-se que pelo menos desde Campolide até ao cais de Alcântara seja estudado um corredor verde contínuo que cosa os locais, que tenha escala humana e que respeite a estrutura hidrológica existente, aqui através da formação de bacias de retenção e de uma linha de água paralela ao caneiro para apanhamento de águas pluviais, isto de acordo com o conceito continuum naturale defendido pelos mestres Francisco Caldeira Cabral e Gonçalo Ribeiro Telles. Não se trata apenas de emendar os erros do passado, mas sobretudo de preservar esta estrutura ecológica fundamental.
No âmbito das referidas reuniões, garantiu-se também que esse corredor possa terminar num amplo largo de utilização pública, junto da gare marítima de Alcântara, e abriu--se a porta para que uma praça seja feita atrás da mesma, colada ao rio Tejo, sítio hoje em parte ocupado por contentores. Permite-se assim que o corredor pretendido termine num espaço, também ele, para as pessoas e das pessoas.
Ponto que também ficou assente, aliás, como não podia deixar de ser, é que não se mexia na zona, enquanto a avaliação de impacto ambiental conjunta não estivesse concluída. Importava, pois, analisar a questão na sua real dimensão, envolvendo todo o vale de Alcântara, e não reduzir o assunto a um problema de avaliações estratégicas sobre transportes, como pretende a sra. vereadora Helena Roseta.
4. Última nota
Estas actuações inserem-se no âmbito de duas vitórias conseguidas por este executivo: o acordo para que vastos territórios da frente ribeirinha, actualmente sob a jurisdição da APL, passem para a gestão da CML e a aprovação das medidas cautelares do Plano Verde.
Defendo que devia ter havido concurso público para a concessão do porto, em Alcântara, após 2015, mas uma coisa é certa, temos tempo para todos discutirmos as matérias atrás referidas, sem medalhas nem louvores antecipados, mas apenas com o intuito de prosseguir o interesse público.
Vereador do Ambiente, Plano Verde e Espaços Verdes na CML»
Ainda estou na dúvida sobre quem assina este texto: se um homónimo do vereador eleito pelo BE, se um heterónimo do 'ministo jamé'; já do título tenho a certeza que devia ter sido antes: foi você que pediu um prato de lentilhas?
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1 comentário:
«Devia ter havido concurso público para a concessão do porto, após 2015..."
(Mas pronto, isto é um pormenor.)
O BE faz bem em tirar o seu apoio ao Zé. As suas posições, hoje, nada têm a ver com as do BE. Zé, vai-te, és livre para acompanhares o António Costa!
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