Advogados da CML exercem funções privadas ilegalmente -PUBLICO -07.11.2008, José António Cerejo
Executivos sempre o souberam, mas fecham os olhos. Directora jurídica estava numa sociedade
de advogados e é sócia da Edifer
Uma grande parte dos funcionários do Departamento Jurídico da Câmara de Lisboa, entre os quais a sua directora, acumula ilegalmente, ou acumulou até há pouco, as suas funções públicas com a advocacia em regime de profissão liberal. Os sucessivos executivos camarários - incluindo o actual - estavam ao corrente desta situação, mas pactuaram com ela desde sempre.
A lei que estabelece o Estatuto da Ordem dos Advogados não oferece dúvidas, pelo menos desde 1984. Os advogados que são funcionários públicos, incluindo os das autarquias locais, não podem exercer a advocacia privada. Até 2005 havia, porém, uma excepção: aqueles que exercessem "funções exclusivas de mera consulta jurídica" podiam advogar livremente.
Em Janeiro de 2005, com a publicação do estatuto actualmente em vigor, a excepção em causa desapareceu e a incompatibilidade passou a ser total: mesmo os advogados que, enquanto funcionários públicos, se limitam a tarefas de consulta jurídica, sem responsabilidades de acompanhamento de processos e de representação forense, não podem ter actividade privada. Clarificada ficou, no entanto, a intervenção destes funcionários em processos relativos aos serviços em que trabalham. Isto porque a lei passou a permitir-lhes expressamente o exercício da advocacia, desde que isso aconteça "em regime de subordinação e em exclusividade" ao serviço das entidades que os empregam.
A situação daqueles que, até aí, podiam exercer ao abrigo da excepção criada para os funcionários que apenas faziam consulta jurídica foi salvaguardada na nova lei, estabelecendo-se que, a título de direitos adquiridos, poderiam continuar a fazê-lo normalmente.
Ao longo dos anos, dezenas de pareceres dos conselhos distritais, do Conselho Geral e do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, bem como alguns acórdãos dos tribunais administrativos, consolidaram a interpretação que resulta directamente do texto da lei e não deixaram margem para polémicas. "A orientação da Ordem dos Advogados nesta matéria não oferece dúvidas; é constante no sentido da incompatibilidade da actividade de funcionário com a advocacia", ressalvada a excepção relativa aos casos em que "os quadros orgânicos dos serviços respectivos prevejam expressamente funções de mera consulta jurídica", afirmava já em 1999 um parecer do Conselho Geral da Ordem, subscrito por Germano Marques da Silva.
Situação vem de longe
No caso do Departamento Jurídico (DJ) da Câmara de Lisboa, que emprega dezenas de advogados, esta ressalva nunca foi aplicável porque a orgânica do município não contempla em parte alguma o exercício exclusivo da "mera consulta jurídica". Sucede que os sucessivos executivos têm ignorado o texto da lei e a jurisprudência estabelecida, aceitando que os seus juristas exerçam a advocacia privada, em sociedade de advogados ou por conta própria.
A própria directora do DJ, Paula Pires Coelho, nomeada em Maio por António Costa, trabalha na câmara desde 1987 e acumulou durante muitos anos as suas funções públicas com a sua actividade na sociedade de advogados Correia, Seara & Associados. De acordo com o gabinete do presidente da câmara, que apenas respondeu a algumas das perguntas que lhe foram dirigidas pelo PÚBLICO, aquela funcionária pediu, porém, em Maio, a "exclusão" da sociedade de advogados de que era sócia. Segundo a própria afirma numa nota escrita, "antes da referida exclusão de sócia não exercia e nunca exerceu ali qualquer actividade de advocacia privada" - declaração que contraria a sua condição de sócia de uma sociedade de advogados, onde aliás ainda tem secretária.
Por explicar fica o facto de a directora ter julgado necessário deixar a sociedade de advogados, enquanto nos seus serviços abundam os advogados em situação de acumulação ilegal, mas tolerada.
****
Directora pertence aos órgãos sociais de um dos principais credores da câmara
Para lá da ligação de Paula Pires Coelho a uma sociedade de advogados, a sua situação profissional levanta algumas questões por via da relação que mantém com a Edifer, uma empresa de construção civil que figura entre os principais credores da Câmara de Lisboa. Sendo uma importante accionista daquela sociedade, na qualidade de filha de um dos seus fundadores, a advogada ocupa as funções de secretária da mesa da sua assembleia geral (com autorização camarária) e coordena, enquanto directora do Departamento Jurídico (DJ) do município (função que já ocupou em 2002), serviços que intervêm na negociação das dívidas da autarquia aos seus fornecedores.
Numa declaração de impedimento que apresentou em Abril deste ano e que foi transcrita numa informação produzida pelo gabinete de António Costa, Paula Coelho afirma que, enquanto funcionária municipal, "nunca participou em qualquer procedimento" que tenha a ver com a Edifer, nem teve nem terá intervenção em acções relacionadas com aquela empresa. O PÚBLICO não conseguiu apurar se já tinha entregue alguma declaração do género anteriormente, porque nunca conseguiu falar com a jurista, mas constatou que a informação do gabinete é incorrecta quando diz que "as negociações com os credores" da câmara "estão a ser conduzidas pela Direcção Municipal de Finanças, não pelo DJ". Numa outra nota da presidência é a própria quem confirma que os advogados do seu departamento representam o município nas "tentativas de conciliação" com os credores, que se realizam no âmbito do Instituto da Construção e do Imobiliário. Entre os muitos juristas do DJ que exercem advocacia privada à revelia da lei encontram-se Francisco Gamboa (sócio da Correia, Seara & Associados, tal como era Paula Coelho), Alexandra Nobre e Rute Felizarda (que partilham um escritório privado em Lisboa). O PÚBLICO não conseguiu falar com nenhum deles.
Executivos sempre o souberam, mas fecham os olhos. Directora jurídica estava numa sociedade
de advogados e é sócia da Edifer
Uma grande parte dos funcionários do Departamento Jurídico da Câmara de Lisboa, entre os quais a sua directora, acumula ilegalmente, ou acumulou até há pouco, as suas funções públicas com a advocacia em regime de profissão liberal. Os sucessivos executivos camarários - incluindo o actual - estavam ao corrente desta situação, mas pactuaram com ela desde sempre.
A lei que estabelece o Estatuto da Ordem dos Advogados não oferece dúvidas, pelo menos desde 1984. Os advogados que são funcionários públicos, incluindo os das autarquias locais, não podem exercer a advocacia privada. Até 2005 havia, porém, uma excepção: aqueles que exercessem "funções exclusivas de mera consulta jurídica" podiam advogar livremente.
Em Janeiro de 2005, com a publicação do estatuto actualmente em vigor, a excepção em causa desapareceu e a incompatibilidade passou a ser total: mesmo os advogados que, enquanto funcionários públicos, se limitam a tarefas de consulta jurídica, sem responsabilidades de acompanhamento de processos e de representação forense, não podem ter actividade privada. Clarificada ficou, no entanto, a intervenção destes funcionários em processos relativos aos serviços em que trabalham. Isto porque a lei passou a permitir-lhes expressamente o exercício da advocacia, desde que isso aconteça "em regime de subordinação e em exclusividade" ao serviço das entidades que os empregam.
A situação daqueles que, até aí, podiam exercer ao abrigo da excepção criada para os funcionários que apenas faziam consulta jurídica foi salvaguardada na nova lei, estabelecendo-se que, a título de direitos adquiridos, poderiam continuar a fazê-lo normalmente.
Ao longo dos anos, dezenas de pareceres dos conselhos distritais, do Conselho Geral e do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, bem como alguns acórdãos dos tribunais administrativos, consolidaram a interpretação que resulta directamente do texto da lei e não deixaram margem para polémicas. "A orientação da Ordem dos Advogados nesta matéria não oferece dúvidas; é constante no sentido da incompatibilidade da actividade de funcionário com a advocacia", ressalvada a excepção relativa aos casos em que "os quadros orgânicos dos serviços respectivos prevejam expressamente funções de mera consulta jurídica", afirmava já em 1999 um parecer do Conselho Geral da Ordem, subscrito por Germano Marques da Silva.
Situação vem de longe
No caso do Departamento Jurídico (DJ) da Câmara de Lisboa, que emprega dezenas de advogados, esta ressalva nunca foi aplicável porque a orgânica do município não contempla em parte alguma o exercício exclusivo da "mera consulta jurídica". Sucede que os sucessivos executivos têm ignorado o texto da lei e a jurisprudência estabelecida, aceitando que os seus juristas exerçam a advocacia privada, em sociedade de advogados ou por conta própria.
A própria directora do DJ, Paula Pires Coelho, nomeada em Maio por António Costa, trabalha na câmara desde 1987 e acumulou durante muitos anos as suas funções públicas com a sua actividade na sociedade de advogados Correia, Seara & Associados. De acordo com o gabinete do presidente da câmara, que apenas respondeu a algumas das perguntas que lhe foram dirigidas pelo PÚBLICO, aquela funcionária pediu, porém, em Maio, a "exclusão" da sociedade de advogados de que era sócia. Segundo a própria afirma numa nota escrita, "antes da referida exclusão de sócia não exercia e nunca exerceu ali qualquer actividade de advocacia privada" - declaração que contraria a sua condição de sócia de uma sociedade de advogados, onde aliás ainda tem secretária.
Por explicar fica o facto de a directora ter julgado necessário deixar a sociedade de advogados, enquanto nos seus serviços abundam os advogados em situação de acumulação ilegal, mas tolerada.
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Directora pertence aos órgãos sociais de um dos principais credores da câmara
Para lá da ligação de Paula Pires Coelho a uma sociedade de advogados, a sua situação profissional levanta algumas questões por via da relação que mantém com a Edifer, uma empresa de construção civil que figura entre os principais credores da Câmara de Lisboa. Sendo uma importante accionista daquela sociedade, na qualidade de filha de um dos seus fundadores, a advogada ocupa as funções de secretária da mesa da sua assembleia geral (com autorização camarária) e coordena, enquanto directora do Departamento Jurídico (DJ) do município (função que já ocupou em 2002), serviços que intervêm na negociação das dívidas da autarquia aos seus fornecedores.
Numa declaração de impedimento que apresentou em Abril deste ano e que foi transcrita numa informação produzida pelo gabinete de António Costa, Paula Coelho afirma que, enquanto funcionária municipal, "nunca participou em qualquer procedimento" que tenha a ver com a Edifer, nem teve nem terá intervenção em acções relacionadas com aquela empresa. O PÚBLICO não conseguiu apurar se já tinha entregue alguma declaração do género anteriormente, porque nunca conseguiu falar com a jurista, mas constatou que a informação do gabinete é incorrecta quando diz que "as negociações com os credores" da câmara "estão a ser conduzidas pela Direcção Municipal de Finanças, não pelo DJ". Numa outra nota da presidência é a própria quem confirma que os advogados do seu departamento representam o município nas "tentativas de conciliação" com os credores, que se realizam no âmbito do Instituto da Construção e do Imobiliário. Entre os muitos juristas do DJ que exercem advocacia privada à revelia da lei encontram-se Francisco Gamboa (sócio da Correia, Seara & Associados, tal como era Paula Coelho), Alexandra Nobre e Rute Felizarda (que partilham um escritório privado em Lisboa). O PÚBLICO não conseguiu falar com nenhum deles.
5 comentários:
Paula Coelho além de accionista da EDIFER e irmã da CEO, desempenhou finções de ASSESSORA de fontaõ de carvalho no tempo do carmonoa, quando ele tutelava o DEpartamento de Ptrimonio Imobiliário da Camara
Que acham? è sempre tudo assim
PULHAS
BANDALHOS
Porra !
Só a mim me custa tanta a ganhar o mísero ordenado e sem nunca sair da cepa torta!
...e que tal apurar os nomes dos dirigentes da Câmara que exercem advocacia? Com escritório em Lisboa. Mais, sócios de grandes escritórios...
E os que estão meses ou anos sem serem vistos no serviço, recebendo pontualmente o ordenado?
E o Saraiva de Lemos que acumula exclusividade na Ordem dos Arquitectos e na CML?
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