sexta-feira, dezembro 12, 2008

Paulo Morais: Artigo de opinião no JN

"Natal à porta. A maioria das famílias portuguesas refugia-se nos centros comerciais e grandes superfícies. E não nos iludamos: este já não é um efeito sazonal, mas sim um sintoma mais profundo da falta de gestão do espaço público.

Não foi só o comércio, mas sim a vida das cidades que parece ter-se deslocado definitivamente das ruas para o interior dos centros comerciais. Afinal, estes propiciam-nos a qualidade de vivência que em tempos caracterizava os núcleos urbanos. O verdadeiro centro cívico e cultural das cidades transferiu-se para os shoppings.

Nos centros comerciais, o acesso é normalmente fácil e o estacionamento quase sempre gratuito. No seu interior, a limpeza é regra. Ao abrigo de qualquer intempérie meteorológica, circula-se confortavelmente e em segurança. Há acessos para pessoas com mobilidade reduzida e carrinhos de bebé. Os pequenos problemas que as famílias enfrentam, como a necessidade dum espaço para mudar fraldas ou levar miúdos à casa de banho, estão perfeitamente acautelados. Juntemos a isto a possibilidade de almoçar e jantar em conta, ou ainda assistir a um filme de estreia. Só aqui vemos implementado um novo conceito de centro cívico urbano.

Na outra face da moeda, temos as baixas das cidades, a que não se acede facilmente, onde o trânsito é habitualmente caótico. O estacionamento é inexistente ou caríssimo. As ruas e passeios estão em péssimo estado, fruto duma crónica ausência de manutenção e conservação. Os idosos correm perigo permanente de tropeçar num qualquer buraco. A via pública está imunda, resultado duma limpeza urbana ineficaz. Somos permanentemente abordados por arrumadores de automóveis e pedintes. Se um miúdo necessita de ir à casa de banho, está sujeito à fila interminável do café ou a ter de pagar o acesso a um desses "wc" tipo nave espacial. A oferta cultural é escassa, não há cinemas, os concertos e espectáculos são raros e têm quase sempre pendor elitista. Não nos admiremos, pois, pelo facto de os centros urbanos estarem em processo de morte lenta e o comércio tradicional em estado comatoso.

Enquanto isto, os representantes do comércio tradicional limitam-se a reclamar contra os centros comerciais. Atiram ao alvo errado. Mais do que tentar impedir o sucesso dos centros comerciais, deveriam era copiar a receita desse êxito. E queixar-se, em primeiro lugar, das câmaras municipais que se revelam incompetentes na gestão do espaço público."

3 comentários:

Anónimo disse...

Já ali em baixo diz:

"Son muchas las veces que se han escrito guías para conocer Lisboa, la capital más occidental de Europa, esa ciudad que llegó a ser dueña de un imperio. Esa Lisboa ahora decadente, de paredes agrietadas y casas vacías. Esa Baixa lisboeta en la que en la década de los 20, Fernando Pessoa, el mayor poeta de la lengua portuguesa, y todos los heterónimos que llevaba dentro, paseaban por las calles entonces llenas de otra vida."

La Lisboa de Fernando Pessoa, no El Mundo.


E o que se diz de Lisboa, diz-se de qualquer (grande) cidade tuga.

Anónimo disse...

as coisas não são tão preto no branco como o senhor quer fazer parecer... OK. Dá o exemplo de Lisboa. Mas e então o exemplo de cidades mais pequenas, que não têm esse problema de estacionamento, por exemplo?
O problema é de cultura!

Anónimo disse...

Acho tão engraçado o comentário sobre a cultura, quando se fala de centros comerciais.

Quem o faz certamente se esquece que a cultura é de todo um povo. Não ditada apenas por um. Se não gosta mude de país.

Por mim continuarei a preferir os CC para compras pois sobra-me sempre muito mais tempo para fazer aquilo que realmente gosto - estar com a familia. Só alguem completamente desajustado acha engraçado ir para a baixa fazer compras com duas crianças pequenas mais a avó durante uma manhã inteira.

A sociedade não é a mesma de há umas décadas. Hoje ninguem tem tempo para se sujeitar a certas actividades que há uns anos eram normais. é a realidade presente - quem a nega vive noutro mundo.