Há muito que me interesso pelo problema da doação de órgãos. Se bem se lembram, em Julho escrevi um artigo intitulado “O Meu Cadáver”, em que me insurgia contra a lei vigente, baseada no chamado consentimento presumido, e contra a incúria dos serviços encarregues da recolha. Eis que, nesta frente, surgem novidades. Segundo aVisão, o chefe da equipa de transplantes do Curry Cabral, além do respectivo salário-base, ganhou prémios, no ano passado, no valor de 277 mil euros. Apanhado, declarou não ser “um mercenário”para, em seguida, se demitir do cargo presidencial. Trabalhando num hospital do Estado, com as facilidades inerentes a quem tem vínculo, estes médicos olham a vida como se estivessem na privada, não lhes ocorrendo que aqui é o mercado quem determina o mérito e não os próprios. Além da promiscuidade evidente entre os postos, a brincadeira pode sair cara ao país. O Dr.Manuel Antunes, de Coimbra, o qual, desde há vários anos, faz transplantes do coração sem nunca ter recebido “incentivos”, declarou considerar a sua equipa credora de 2,6 milhões de euros do Estado pelas operações realizadas desde2003. Sabendo o que se passa, espero que doravante os pais ensinem os filhos a responder à pergunta “o que queres ser quando fores grande?” da seguinte forma: “Cirurgião de transplantes hepáticos no Curry Cabral.”
Maria Filomena Mónica
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