sexta-feira, fevereiro 29, 2008

redescobrir ou trilhar novos caminhos é que é a cena

Cool, cool é a deriva pela cidade. Diz quem sabe uma coisa ou duas do assunto...

"7 Colinas Zapping"
Público 28.02.2008, Kalaf Ângelo

Seis horas do meu sábado foram totalmente dedicadas às "compras do mês". O que me convence do facto provável de que faço as compras alimentares mais demoradas de Lisboa! Ao invés de me enfiar num super ou hipermercado, como a maioria faz, ou de me deixar convencer pelo click da mercearia on-line, percorro o eixo Cais do Sodré-Santa Apolónia-Xabregas, a pé e de transportes públicos, com o propósito de abastecer a despensa. Já cheguei a pensar que comprar os frescos num mercado popular como o da Ribeira e a seguir entrar numa loja gourmet em busca do melhor vinagre balsâmico era das coisas mais cool que podia orgulhar-me de fazer em Lisboa. Mas estava então longe de me aperceber que o acto de me movimentar pela cidade usando o cartão zapping é a próxima acção mais cool que um indivíduo pode praticar depois de deixar de fumar...
Os trendsetters - criaturas que não têm medo de ousar e tudo fazem para se distinguirem do grupo - consideram que ter "carta" de condução é cool, mas ser proprietário de um automóvel está completamente fora de moda. Claro que estes enunciados são expressões de um outro, o da Europa verdejante. Não nos podemos esquecer de que o Reino Unido instituiu leis duríssimas para os que trazem os carros mais poluentes para dentro da cidade e que há 20 anos que a Alemanha tem eficazes políticas ambientalistas em funcionamento. Mas o sujeito cool não se posiciona aí; gosta das coisas boas da vida e isso deixa pouco espaço para a exaltação. A indiferença faz parte deste estar; redescobrir ou trilhar novos caminhos é que é a cena. Portanto, adoptar um comportamento greenpeace está também fora de questão. Não combina nada com o cardigan Armani ou os Air Force customizados made in China.
Mas, afinal, perguntará o leitor, o que é ser cool? Eu arrisco-me a definir: ser cool é saber tirar o melhor de cada experiência, por mais banal que seja. É deixar que tudo à nossa volta pulse e vibre de acordo com a sua intensidade própria e, sem precisarmos de nos convertermos ao budismo, encontrarmo-nos algures dentro dessas intensidades. Para muitos, porém, o conceito cool está apenas associado a uma ideia de consumo. E talvez não estejam assim tão errados. Afinal, o comportamento cool introduziu-se num mundo obcecado com a juventude e a imagem. Um produto só vinga no mercado se for considerado cool. E quem torna esse produto cool é o consumidor, que, para ser cool, terá que consumir o produto em causa. Na tentativa de controlarem o próximo objecto ou acção cool, correm as instituições em busca dos melhores market researchers, cool hunters ou mercadores do cool. Todos em busca do consumidor do cool: os adolescentes. Jovens com menos de 18 anos, difíceis de agradar ou fidelizar, mas representativos de uma fatia de mercado que nenhuma marca pode deixar escapar, pois a seu reboque virá sempre, pelo menos, um adulto. E assim se factura. O único senão é que o que é cool hoje, amanhã poderá cair por terra. E essa é a melhor parte do movimento.

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