O Primeiro-Ministro afirmou na terça-feira que a crise orçamental portuguesa está ultrapassada e os factores que a motivaram resolvidos, tudo sem comprometer o crescimento económico... A afirmação é deveras extraordinária, num contexto de reconhecida crise externa e interna.
Aparentemente, o Senhor Primeiro-Ministro não se deu conta de que vivemos uma crise económica tão grave que levou destacados economistas a falar da pior crise do pós-guerra e, como é óbvio, Portugal não é a ilha da Utopia. Longe disso.
Isolado no mundo virtual e marketizado a que se remeteu, o Primeiro-Ministro não vê a situação dos pensionistas e reformados; a brutal taxa de desemprego; as famílias endividadas; os jovens sem futuro profissional; o ensino desqualificado e desadequado; a queda do investimento estrangeiro, os juros que sobem, o sistema judicial em desmantelamento; a saúde adiada; ou a burocracia que leva à perda de fundos comunitários. Também não vê a rigidez da despesa pública nem o súbito zelo dos pequenos poderes que entram em sindicatos ou fecham indústrias tradicionais, apelam à delação ou simplesmente acham plausível que um cidadão guarde todos os recibos de tudo quanto adquire durante cinco anos... (em que assoalhadas, Senhor Primeiro-Ministro, nas do Palácio de S. Bento?)
E há também a nova tentação de controlar os costumes de cada um, de qualquer forma, seja piercing ou casamento e a concentração policial. De vez em quando somos brindados com grandes produções: quem não se lembra e não se comoveu com a imagem de lindas crianças curvadas sobre excelentes computadores? Pena que não passasse tudo de uma produção (boa, diga-se).
Qual a realidade vivida pelo Primeiro-Ministro, que não vê a desqualificação da democracia com a funcionalização das autonomias, a politização da Administração Pública? Por onde anda o Senhor Primeiro-Ministro que não vê essa gelatinosa cultura da arrogância pública a espalhar-se na vertical?
Não há fio condutor para um projecto de caminho.
Atrás do espelho de Alice, o Senhor Primeiro-Ministro não governa, gere uma grande produção.
No fundo, talvez nem fosse assim tão mau que o Primeiro-Ministro não governasse... se não desgovernasse.
Descendo à Terra, o Senhor Primeiro-Ministro teria muito com que se preocupar nas duas casas que é suposto governar enquanto o Poder (mal) as une.
Paula Teixeira da Cruz
1 comentário:
É pena é que este desabafo de Paula Teixeira da Cruz se depare com o total, completa e absoluta auseência de alternativas em termos de projecto, de iniciativa e possibilidade de poder.
É que se pensarmos no chefe de um grupo chamado Filipe Menezes dá-se outra volta ao estomago.
Com ele tudo seria ainda pior e com mais palhaçada.
De mau de muito mau para pior não é o caminho.
Dra dê-nos uma ideia para o futuro!
CC
António Eloy
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