quinta-feira, março 27, 2008

A impunidade, a excepção e a regra

QUANDO ALGUÉM se prepara para cometer uma infracção, compara as vantagens expectáveis com a penalidade correspondente.
Em seguida, associa (mesmo que inconscientemente) o valor da penalização à probabilidade de ela ocorrer e faz uma espécie de multiplicação de cabeça. No entanto, é bem sabido que, se a probabilidade for muito baixa, o facto de a penalidade ser elevada pouco adianta.
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Hoje vi, da minha janela, a Polícia Municipal a bloquear carros. De manhã, era a EMEL que o fazia. Isso sucede todos os dias, de 2ª a 6ª feira. Então porque é que as pessoas continuam a estacionar assim (sujeitando-se a multas de €30, pelo menos), quando - ainda por cima - há parques de estacionamento às moscas e lugares vagos, em volta, a partir de 0,25€?
É porque, apesar de tudo, ainda acham que a probabilidade de serem multadas é baixa, pelo que a infracção vale a pena.
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E é por isso que, a propósito do caso da aluna do telemóvel, a garantia de que terá uma punição exemplar me deixa muito frio. Alguém acredita que, mesmo que tal suceda, isso seja algo mais do que a excepção que confirmará a regra?
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Actualização

O QUE SUCEDE tem uma explicação matemática, para a qual vou arbitrar alguns valores que não devem andar muito longe da realidade:
Imagine-se que, antes da actual vaga repressiva, as pessoas tinham a sensação de que a probabilidade de serem multadas era de - digamos - 1%.
Vamos supor que as autoridades aumentaram a sua acção para o dobro ou mesmo para o triplo.
O que sucedeu foi que a sensação de impunidade baixou de 99% para 97% - o que, em termos psicológicos, é rigorosamente o mesmo. E mesmo que os números não sejam esses, não andam muito longe.
De facto, ainda hoje vi as carrinhas bloqueadoras passarem por muitos carros em infracção sem fazerem nada. Multam dois aqui, bloqueiam três mais à frente, rebocam quem não está a incomodar ninguém (como a carrinha que se vê na foto)... criando uma ideia (aliás, verdadeira!) de que só é penalizado quem tem azar.

Acrescem ainda outras realidades:
Muitos condutores vêm de outras zonas da cidade (ou do país) onde sabem que a probabilidade de serem multados é ZERO.
Outros, sabem que, se não pagarem as multas, não lhe acontece nada (30% das multas da EMEL ficam por pagar, e as da PSP prescrevem regular e oportunamente...).
A lei não é aplicada aos fins-de-semana, pelo que se podem ver carros a atafulhar passeios, passadeiras de peões, estacionamentos para deficientes e paragens de autocarro, mesmo quando o estacionamento é gratuito e abundante.

O pior é que, nestes casos (como nos outros de que agora tanto se fala), a sensação de impunidade tem consequências, a prazo mais ou menos curto, muito para além do que está directamente em causa.

1 comentário:

Miguel Carvalho disse...

E aumentar as multas?