sexta-feira, junho 20, 2008

A PRAÇA DAS FLORES

A polémica: a Praça das Flores, catita e tradicional, um enclave de bom gosto entre o Príncipe Real e a Rua de São Bento em Lisboa, foi cedida pela Câmara Municipal de Lisboa a uma empresa privada, a Skoda, para divulgação de novo modelo de automóvel e realização de festas e concertos para convidados durante 15 dias consecutivos de Junho. Que espécie de cedência foi esta? Quem autorizou? Devemos censurar a marca Skoda por ter capital para o evento? Que contrapartidas para a câmara e os moradores? Por quê tantos dias consecutivos do melhor mês do ano para se viver em Lisboa? Será isto um arraial?

Os factos: a Skoda paga à câmara de António Costa 150 mil euros pelo aluguer do espaço público (espaço público que ficou vedado aos moradores e limitado ao comércio durante o horário das festas, todos os dias) e garante ainda a reabilitação da praça e jardim depois de finalizado o evento. Não parece mau, mas é presente envenenado. Pergunto: para onde vão os 150 mil euros? E a “reabilitação” da Praça das Flores (custo 30 mil euros) assegura manutenção futura? Gostaria de pensar que parte dos 150 mil euros venham a ser entregues a empresas de jardinagem, mas não sei. Falamos daqui a uns meses, para confirmar (ou não) o abandono da praça.

Eu não sou morador da zona e, apesar de sistematicamente censurar o fecho da Avenida da Liberdade ou Praça do Comércio para realização de festividades, acredito na privatização excepcional e pontual de espaços públicos, desde que gerida com sensibilidade e respeito (nunca por tantos dias consecutivos). Na Praça das Flores, o evento desrespeitou o biorritmo dos moradores (mais do que um bairro tradicional, é zona habitacional) e insultou a indulgência dos comerciantes que ficaram excluídos do perímetro das festas. O que falta discutir: o elitismo da coisa. Se a Skoda tivesse ocupado uma praça onde residem menos “opinion makers”, talvez a questão não tivesse chegado à imprensa. Mas teria sido uma pena esconder o escândalo (em que a câmara privatiza um espaço público) apenas por ele se realizar na Mouraria ou em Marvila, onde vivem menos jornalistas. Por isso, felizmente, ele aconteceu na Praça das Flores e foi denunciado. Claro que o facto de o padrinho da iniciativa ter sido Sá Fernandes, vereador da câmara pelo Bloco de Esquerda, ajudou a polarizar a questão. É verdade que ele deu a cara, que assumiu a responsabilidade e o risco do negócio (a câmara precisa de dinheiro, toca a alugar praças), mas isso não o iliba. De certa forma, ele traiu a nossa confiança. E para restituir a confiança não basta devolver a praça ou oferecer flores. Para começar, é preciso que Sá Fernandes não pareça ser igual aos outros. Ora, a melhor maneira de não se ser confundido é distinguindo-se. Preferivelmente pelas boas razões ou uma causa ainda melhor.

Miguel Somsen


In Metro

6 comentários:

Carlos Medina Ribeiro disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Carlos Medina Ribeiro disse...

Para mim (e para muitos lisboetas), Sá Fernades está a ser uma triste desilusão.

Mas, neste caso da Praça das Flores, ele pode estar a ser vítima de uma injustiça pois, segundo li, a decisão em causa foi tomada pela vereação anterior.

Mais concretamente: por um vereador do PSD que, agora, votou a moção de censura contra ele...

Anónimo disse...

Acho muito bem que se privatize todo o espaço da Praça das Flores com os seus moradores que tiveram a infeliz ideia de quererem morar nessa zona pensando que era um jardim. E digo mais, toda a cidade de Lisboa deve ser privatizada. Todo o país, todo o continente, todo o planeta, deve ser privatizado aos ETs, começando pelos espanhóis que nunca se cansaram de querer anexar o nosso querido e doce Portugal. A nossa independência deve ser privatizada e vendida às lojas francas chinesas que merecem uma oportunidade para fazer negócio junto dos autarcas da nossa querida e limpa cidade de Lisboa, tão em sintonia com o patriótico trabalho que o senhor Vale e Azevedo tem desenvolvido na City de Londres. Privatizemos os hospitais dos alucinados de S. Bento e façamos dos seus utentes os novos viriatos da nossa selecção associados à bela cidade donde se vê o Tejo e onde se pode andar de automóvel sem se ser incomodado pelos peões. O país agradece e a economia tem a sua oportunidade para virar a crise que insiste em tornar mais negras as frases optimistas e sempre oportunas do senhor ministro da economia.

Anónimo disse...

Decisões de vereações anteriores... e de quem foi a decisão de agora entregar o Jardim da Estrela ao Continente, para poderem durante 3 anos fazer lá os eventos que lhes apeteça?

Anónimo disse...

Ena pá, essa do Jardim da Estrela é forte. Então o Senhor Belmiro não se contenta com o Porto e o senhor Sá Fernandes não se contenta com o castelo? Eu não dizia que o futuro está na privatização total da cidade? Só nos resta emigrar, antes que apareça algum fiscal a exigir uma taxa de residência social para subsidiar o PRODEP.

Anónimo disse...

PROSTITUIÇÃO: aluguer de espaços íntimos por tempo determinado para a prática de actividades de lazer privadas. A sua promoção (lenocínio) é ilegal em Portugal!


Prostituição da Cidade, é o que são as privatizações pontuais de espaços públicos! Deveriam também ser proibidas!


Querem privacidade, aluguem espaços privados - ele há por aí tantos, até Municipais...


De que está à espera a Assembleia da República para legislar nesse sentido? Ou a Assembleia Municipal de Lisboa, se fosse o assunto da sua competência?


O resto é simplesmente azia, ou mau feitio...