quarta-feira, abril 09, 2008

Análise comparativa do impacte paisagistico da localização da terceira travessia do Tejo nos corredores Chelas- Barreiro e Beato-Montijo.

1. Razão de Ordem


O presente capítulo estuda o impacte paisagístico dos dois corredores alternativos para a implantação da nova ponte, sobre a parte do estuário onde o Tejo passa entre Barreiro, Almada e Lisboa. Para este estudo comparativo, considera-se a paisagem Lisboa/Almada/Tejo através da análise do sistema de vistas constituído pela superfície de água que é vista das margens e pelas áreas de cidade donde se vê a parte do estuário do Tejo afectado por qualquer um dos corredores. Considera-se assim a área em estudo como o estreitamento da desembocadura Lisboa-Almada-Trafaria e o alargamento do Tejo que a partir do aeroporto do Montijo se define em frente de Lisboa,. do Barreiro e de Almada.

Fig. 1. (ver aqui)

Para efeitos deste estudo apresentam-se as regras internacionais que definem parâmetros de análise de paisagens culturais e as definições municipais do PDM de Lisboa que incluem a definição e localização do sistema de vistas de Lisboa.

É também feita a revisão da bibliografia relativa à quantificação do valor panorâmico de uma área e do valor intrínseco de uma paisagem e são analisados como precedente o relatório da “Comissão de Sábios” que acompanhou o projecto do elevador Borratem-Castelo de S. Jorge em 2001. A metodologia de quantificação das vistas é aplicada em parte ao caso em estudo e o estudo comparativo de impacte dos dois corredores é apresentado em quadro comparativo do mais importante alinhamento de vistas, decorrendo dele as recomendações da equipa.



2. Regras de classificação e protecção de paisagens e sistema de vistas

2.1. Paisagens culturais: definição e critérios de avaliação da Convenção do Património Mundial (UNESCO)

A identificação do objecto.em estudo é o primeiro passo desta análise e será abordada de acordo com os procedimentos do património mundial (UNESCO) identificando-se esta área do estuário do Tejo como uma paisagem cultural (art.º 47 das Orientations devant guider la mise en oeuvre de la convention du patrimoine mondial) que entra na classificação (V) por se inscrever na seguinte definição: “Ser um exemplo eminente do estabelecimento humano tradicional da utilização tradicional do território ou do mar, que seja representativo de uma cultura (ou culturas) ou da interacção humana com o ambiente, especialmente quando este se tornou vulnerável sob o impacte de uma mutação irreversivel”; e também se insere na classificação (VII) “Representar fenómenos naturais significativos ou sítios de uma beleza natural e de uma importancia estética excepcionais”. Estas classes de paisagens culturais são avaliadas por três parâmetros: integridade, autenticidade e raridade.

Fig. 2.1. (ver aqui)

A paisagem cultural em análise pode ser inscrita nestas duas classificações por se tratar de uma paisagem onde o estabelecimento humano é milenar e ainda porque a interacção humana com o ambiente se encontra ameaçado por uma mutação irreversivel: a construção de uma ponte que secciona esta paisagem.

Esta área do estuário do Tejo representa também um fenómeno natural excepcional, apresentado por Orlando Ribeiro na década de 50 e a partir de cujos trabalhos de geografia, José Augusto França sintetiza: “Lisboa nasceu do rio, do largo estuário do Tejo que nos princípios do Quaternário se sabe estar unida ao Sado na grande depressão hispano-lusitânica” na qual emergia como uma ilha a serra da Arrábida.” [1] Por esta razão a superfície de água no Mar da Palha é muito mais largo (10km até ao Seixal) que o afunilamento entre Almada e Lisboa com cerca de 1,5 kms apenas, pois este corresponde ao antigo golfo marinho que rompeu ligando-se ao estuário e criando uma situação única de porto marítimo e fluvial, protegido e com acesso natural ao mar. A este fenómeno geológico único, associa-se uma beleza natural inquestionável, cuja excepcional importância estética se pretende aqui analisar e defender.

Como já se mencionou, de acordo com as regras de classificação de paisagem cultural da Unesco, os factores de valorização são a integridade, a autenticidade e a raridade. O aprofundamento da aplicação destes parâmetros não será apresentado neste estudo, podendo com facilidade ser feito em desenvolvimentos posteriores, visto que não é indispensável para se alcançar as conclusões naturais. No entanto, numa primeira análise, o estuário do Tejo encontra-se praticamente. íntegro (tendo presente as lesões de que foi sendo alvo desde o processo de industrialização iniciado na segunda metade do Século XIX) como ecossistema e a relação das populações das suas margens com os movimentos dinâmicos da água do rio em permanente descida, e da água do mar subindo o rio, em movimento pendular de marés, mantém-se em equilíbrio, cumprindo o critério da integridade

A autenticidade da paisagem como estuário foi mantida apesar das alterações impostas nas suas margens para adaptação às actividades humanas. O rio como via de navegação milenar e os movimentos das populações sobre o rio fazem parte deste equilíbrio.

A raridade das formas topográficas é inquestionável: as margens não formam planícies de leito de cheia como seria de esperar num rio antigo com uma enorme bacia hidrográfica, mas pelo contrário, a superfície de água tem uma interface com colinas de cerca de 100 metros em Lisboa e Almada, expostas ao rio e criando mais uma excepcionalidade, pois este alarga em frente destas cidades com uma superficie de água com cerca de 7000 ha. As gravuras antigas (do seculo VII ao seculo XIX) que registam Lisboa, nunca esquecem esta trilogia: o Tejo com uma largura excepcional, as colinas e a intensa utilização do plano de água por embarcações. Neste trio lisboeta, o estuário tem o papel principal e mais parece que uma parte de cidade flutua em caravelas e outras e variadas embarcações sobre o rio.


2.2. As regras europeias relativas à protecção das Paisagens

Estas regras estão especialmente consignadas na Convenção Europeia da Paisagem (Florença 2000) e os compromissos assumidos por cada Estado Membro, nomeadamente Portugal através do Dec nº 4/2005, permitem apresentar para defesa das paisagens as “Medidas Gerais” nos seguintes termos:
1-Reconhecer juridicamente a paisagem como uma componente essencial do ambiente humano, uma expressão da diversidade do seu património comum cultural e natural e base da sua identidade.
2- Estabelecer e aplicar políticas de paisagem visando a protecção, a gestão e o ordenamento da paisagem, através de medidas específicas estabelecidas no art. 6.
3- Estabelecer procedimentos para a participação pública, das autoridades locais e das autoridades regionais e de outros intervenientes interessados na definição e implementação das polítida da paisagem mencionadas na alinea b) anterior.
4- Integrar a paisagem nas suas políticas de ordenamento do território e de urbanismo e nas suas políticas cultural, ambiental, agrícola, social e económica, bem como em quaisquer outras políticas com eventual impacto directo na paisagem.

O estuário do Tejo, na sua relação directa com Lisboa, Almada e as cidades instaladas nas suas margens, constitui uma paisagem de enorme qualidade paisagística e muito alto valor ecológico, devendo por tal ser integrada no ponto 1 das Medidas Gerais da Convenção da Paisagem. O presente estudo insere-se na medida nº2 pois inclui a paisagem nos critérios de avaliação comparada dos dois corredores, como componente da decisão e abre caminho para o estabelecimento de políticas de paisagem que visem a sua protecção através de medidas específicas. É urgente, e apesar de evidente ainda não foi apresentada, a classificação do estuário do Tejo e das suas margens habitadas como paisagem excepcional, de acordo com a Convenção da Paisagem.

A necessidade de estabelecer procedimentos para a participação pública conforma o nº3 das medidas gerais é também premente e no caso em estudo deveriam ser implementados com urgência alguns mecanismos de medição da opinião pública.


2.3. O sistema de vistas do PDM de Lisboa

As componentes ambientais urbanas consideradas no artigo 17º do Cap. I do PDM (1994) de Lisboa incluem o sistema de vistas Dessas são relevantes para o caso de estudo as seguintes inseridos no ARTIGO 23º (Sistema de Vistas)

a) Pontos Dominantes – são Sistemas de Vistas que se apoiam em sítios especialmente destacados pela fisiografia da Cidade, caracterizados pelas Vistas Panorâmicas mais amplas, abrangendo sectores especialmente importantes da paisagem urbana – (…), Castelo de São Jorge, Alto do Parque Eduardo VII, (…), cumeada de Monsanto, (…), cumeada de Chelas/Olivais.
d) Frente Ribeirinha – é um Sistema de Vistas que se apoia nas encostas das colinas ribeirinhas, caracterizado por panorâmicas relacionadas com o Estuário do Tejo. Este sistema divide-se nos seguintes sectores:

Existe também uma regulamentação específica incidindo sobre os espaços públicos que estabelece no art. 22º do PDM a seguinte regra: (Espaços Públicos Ribeirinhos)



3. Não é permitida a obstrução de vistas entre os Espaços Públicos Ribeirinhos e o Rio.

Para a análise da qualidade visual do estuário do Tejo recorre-se aos conceitos estabelecidos no sistema de vistas do PDM e à sua georeferenciação em pontos ou linhas de vistas panorâmicas, como o festo do cimo do Parque Eduardo VII, em pontos patrimoniais de grande afluência da população como o Castelo de S. Jorge e em áreas de encosta com exposição privada (janelas e terraços) e pública (ruas, largos e miradouros) que serão apresentados na metodologia.

Do sistema de vistas do PDM é identificada uma vasta lista de pontos e áreas de valor cénico dos quais seleccionamos aqueles que se inserem na análise de vistas da área do estuário em estudo que designamos “plano de água de incidência de vistas”:

Assim, o sistema de vistas é constituído pelos pontos, linhas ou áreas que usufruem das vistas e pelo objecto observado, o plano de água de incidência de vistas. O valor deste binómio depende do valor autónomo de cada um dos elementos acrescido de um índice de frequência normalmente associado a monumentos.


3. Revisão bibliográfica e precedentes

Da análise de opiniões inseridas nos estudos de avaliação, no capítulo de análise da paisagem do objecto em estudo surgem valorizações não quantificadas do plano de água de incidência das vistas. Expressa pela BPG Atkins, no “Estudo Integrado de Avaliação Preliminar da Terceira Travessia do Tejo no corredor Chelas Barreiro”, lê-se a seguinte opinião: “a extraordinária qualidade paisagística da frente ribeirinha do Tejo, associada à relação visual do Barreiro com Lisboa, poderá vir a constituir-se como um enorme valor urbano, desde que...” “contudo, poderá também, pela sua extensão e localização, constituir um factor de corte visual da unidade de uma vasta região que constitui o estuário, numa zona de grande valor cénico, que é o Mar da Palha”.

Câncio Martins, citando o mesmo relatório da Atkins, sublinha que o corredor Chelas Barreiro “constitui um impacte negativo de elevada magnitude na paisagem central do estuário” (pág. 3).

Parece ser util referir aqui uma situação que pode constituir um precedente para o caso em discussão, que se refere à experiência vivida em 2001 pela autarquia de Lisboa aquando do projecto para a ligação da Baixa ao Castelo. A participação pública não estava prevista neste processo de decisão. Mas a análise do impacte visual do projecto apresentado em maquete numa Exposição nos Paços do Conselho, levou a uma reacção da população que constituí matéria de estudo quanto ao impacte paisagísticao da obra sobre a imagem colectiva e muito valorizada da colina do Castelo de S. Jorge. A “Comissão de Sábios”, denominada Comissão Independente de Avaliação, da qual a autora fez parte, analisou a reacção espontânea da população que expressou a sua opinião através de correio electrónico, de registo no livro da exposição e de artigos nos jornais. O Prof. José Augusto França, que presidia à citada Comissão apresentou os resultados desta participação publica espontânea nos seguintes termos:
“O levantamento de cerca de 1050 opiniões lidas no livro, entre 2 e 21 de Fevereiro, realizado por José Augusto França, contou com cerca de 640 opiniões desfavoráveis (…) e cerca de 320 opiniões favoráveis (…), além de 100 opiniões estranhas ao assunto, indecisas ou confusas. Cerca de 65% das opiniões obtidas por esta via revelaram-se, assim, negativas (…).

O levantamento realizado por Paula Marques do correio electrónico, até 21 de Fevereiro, no total de cerca de 1520 unidades (…) com percentagem negativa de cerca de 75% (…).

O levantamento das numerosas, mas dificilmente contabilizáveis, opiniões registadas pela imprensa, entre 18 de Janeiro e 22 de Fevereiro, em peças de índole muito variada, da simples informação, com ou sem comentário, anónimo ou não, de cartas de leitores ou de opinião mais assente em inquéritos de perguntas (como o conduzido regularmente pelo “Diário de Notícias” ou no “Jornal de Letras” de 21 de Fevereiro, endereçado a autores mais especializados, ou em artigos mais substanciais, revela uma maioria amplamente desfavorável.

A análise sucintamente realizada por José Augusto França, (…) levou a seleccionar posições opostas de figuras especialmente representativas em vários sectores da sociedade, que parecem dever ser qualitativamente consideradas. (…)”

Parece evidente que para permitir uma participação pública na decisão sobre a localização do corredor da terceira travessia do Tejo, é viável criar sistemas de recolha de opinião pública eficazes e rápidos a partir de simulações do impacte dos dois corredores que poderiam ser concretizadas. Sondagens, inquéritos ou linha aberta por mail, permitiriam uma avaliação da opinião pública, que recorda ser recomendada na Carta Europeia da Paisagem e estar prevista no PDM de Lisboa.


4. Valor da paisagem designada por plano de água de incidência das vistas. Quantificação do desfrute da paisagem, metodos e procedimentos

Segundo Carl Steinitz, há seis questões que têm que ser respondidas em qualquer problema de projecto (design, alteração, mudança, planeamento) que se centre no aspecto visual. Os métodos de análise da qualidade visual da paisagem de parte do estuário do Tejo que vai sofrer mutações segue este procedimento em seis etapas que se apresentam num grau de complexidade crescente
§ Como descrever a paisagem visual ?(espaço, cor, dados quantificados, significado)
§ Como funciona a percepção que se tem da paisagem ?(percepção parada ou em movimento, a memoria desta percepção , etc... )
§ Avaliar de que forma a paisagem e a sua percepção estão a funcionar bem, sendo que esta é uma avaliação cultural que difere de cultura para cultura.
§ Como é que a paisagem pode mudar? Identificação de alterações possiveis. A paisagem está em análise com vista a protegê-la ou a mudá-la.
§ Partindo do princípio que existem opções como se avalia se uma alternativa é melhor que a outra? São necessários registos, desenhos, simulações, quantificações das diferenças previsíveis que poderão ser causadas pelas alterações.
§ Qual das opções tomar: o que deve ser mudadoou protegido sendo esta a a decisão do projecto, que compete ao decisor..

A metodologia aplicada para identificar a solução com menos impacte negativo adaptou-se a esta sequência sendo necessário explicitar que se optou por um unico exemplo, sendo normalmente necessários mais aplicações..
3.1. Inicia-se assim com a descrição da paisagem constituída pela superficie de Tejo na área de incidência das vistas a partir das cidades que a envolvem, cujo total de população ascende a cerca de 770 000 habitantes: Lisboa, Almada, Barreiro e Seixal.



Fig. 4.1. 1 (ver aqui)

Os parâmetros que entram na descrição do sistema de vistas são, em primeiro lugar, o objecto observado (o plano de água onde temos a incidência de vistas), depois, as áreas e pontos donde o objecto é observado, e ainda a frequência das observações nessas áreas e pontos.

O objecto observado é uma parte da desembocadura do Tejo (cerca de 7000 ha), em interface recortada com as suas margens, a sua ocupação por cidades em planície e um plano de fundo que se eleva até ao castelo de Palmela a nascente e se estende para poente formado pelo volume da Serra da Arrábida, limitado pela sua linha de cumeada.

Para identificar os pontos de vista e sabendo que será necessário descrevê-lo para todo o estuário, considerou-se a cidade de Lisboa em termos topográficos, trabalhando sobre o modelo digital de terreno (curvas de nível:10m). A linha de interface entre a cidade e o rio (plano de água onde temos a incidência de vistas) descreve um arco de círculo e a cidade é marcada por um festo principal, sua espinha dorsal, que a divide em duas partes bem distintas: a cidade a partir da qual se obtém de forma irregular uma relação visual com o rio, e a cidade que fica para trás do festo e perde esta relação.

Traçou-se o festo principal da cidade de forma a identificar a parte de Lisboa “virada para o rio”, ou seja as áreas de exposição média Sul, Sudeste e Este, abaixo da linha de festo, considerando-se estas as áreas sobre as quais se aplica a metodologia e que contêm os pontos de vista também assinalados no sistema de vistas do PDM.

(ver aqui)
Fig. 4.1.2. Áreas de encosta de Lisboa com vistas para o Estuário:

§ Área S com 5 freguesias (≈1430 ha) e ≈56.000 habitantes. Exposição Sul.
§ Área SE com 34 freguesias (≈1400 ha) e ≈165.000 habitantes. Exposição Sudoeste.
§ Área E com 7 freguesias (≈2070 ha) e ≈120.000 habitantes. Exposição Este.

Estas áreas correspondem aos conjuntos de freguesias que foram sobrepostas à carta topográfica e agrupadas por conjuntos de exposições médias.

Identificaram-se, assim, em cada conjunto o total de habitantes sendo eles quem, de forma privada ou pública, gozam destas vista. São cerca de 340 mil habitantes nas encostas viradas para o rio. (Quadro 1)


Quadro 1 - Áreas e números de habitantes de encosta de Lisboa com vistas para o Estuário
(ver aqui)

Não sendo possível neste momento, por falta de meios e de tempo, aplicar esta metodologia às 4 cidades da margem, considerou-se só a parte da cidade de Lisboa com maior densidade de população e a exposição Sudeste sobre a qual a construção da ponte terá maior impacte.


4.1.3. (ver aqui)

4.1.4. Síntese do funcionamento da paisagem (análise de vistas).
O funcionamento das vistas é composto pelo binómio Objecto visto e ponto donde é visto. O corte da cidade de Lisboa obtido a partir de dados topográficos digitais apresenta os pontos mais altos e mais baixos por onde se estendem os limites das áreas que “vêm” o Tejo. Como a paisagem é vista e é em si sitio de vista foram obtidas imagens a partir do plano de água Cacilheiro e Cacilhas para melhor se limitar o objecto em estudo.


4.2. Foi escolhido um alinhamento de vistas desde o ponto mais alto ao ponto mais baixo de uma das encostas viradas para o rio e identificou-se o conjunto mais significativo do sistema de vistas do PDM para aplicar os ângulos de visão2 sobre o estuário.
Assim a partir dos pontos de vista do Parque Eduardo VII, Castelo e Terreiro do Paço e devido à topografia de Lisboa,o funcionamento da tomada de vista da paisagem do rio é o seguinte:

1-o angulo de visão sobre o estuário, dos pontos mais afastados do rio e sobre o festo (Parque Eduardo VII) é de 60º
2- o ângulos de visão do Castelo por se aproximar do rio, aumenta para 120º
3- devido à linha convexa formada pela interface Lisboa-Tejo, o angulo de visão de toda a linha de frente rio à cota da água é de 180º
Fig. 4.2.1 (ver aqui)


[1] Steinitz, Carl, alternative futures ????


4.3. Avaliar de que forma a paisagem e a sua percepção estão a funcionar bem

Do ponto de vista da análise visual os usos actuais destas encostas dividem-se em públicos (ruas, largos e miradouros) e privados (janelas varandas e terraços).
Se o ponto de vista for privado, consideram-se áreas consolidadas, de exposição sobre o estuário e a desembocadura do Tejo e contabiliza-se a população que habita nestas encostas. Apesar de nem toda a população ter vista a partir da sua janela privada, o rio é visto a partir das ruas, dos largos e miradouros constituindo-se como um elemento de grande importância na qualidade destes bairros. Trata-se de uma estimativa grosseira que no caso da topografia de Lisboa oferece grandes surpresas pois o rio aparece em muitos enfiamentos do espaço publico e constitui uma presença permanente.

Fig. 4.3.1. (ver aqui)

Falta também contabilizar a população que trabalha nestas áreas (por exemplo no Chiado), e que acede ou regressa do trabalho através de ruas que têm vistas para o Tejo ou que usam largos ou terraços com vista.

Um outro indicador que pode ser utilizado para a quantificação do valor das vistas é a validade que é dada a uma paisagem pela mão de um artista. O caso mais paradigmático é a montanha St Victoire perto de Aix en Provence, pintada por Cézanne, que levou a uma regulamentação dos pontos de vista que o pintor eternizou nas suas telas e de toda a paisagem que deles se desfruta num ângulo de 65º. No caso de Lisboa pintores como Botelho, Maluda, Nikias Skapinakis (Fig. 3.6.) eternizaram a vista infinita sobre o Tejo valorizando-a. Este valor deverá também ser incluído na apreciação do valor da paisagem. O skyline de Toledo deverá vir a ser matéria de regulamentação pois os milhares de turistas que o visitam como cidade requerem que as imagens das telas de El Greco possam ser apreciadas na imagem da própria cidade, património mundial.

Fig. 4.3.2 – Quadros de Maluda (ver aqui)


4.4. Identificação de alterações possíveis.

A alteração ao estuário surge pelo seccionamento que qualquer travessia do Tejo lhe possa vir a incutir. A alteração infligida pelo corredor Chelas Barreiro é recente quando comparada com a longa historia da alteração imposta pelo corredor alternativo Beato-Montijo que surge no “ano de 1890 feita por uma empresa alemã, que propunha a ligação entre a zona do Beato, do lado de Lisboa, e o Montijo. Esta ideia teve bastante aceitação por parte da opinião pública”[2]. Duarte Pacheco retoma esta localização abrindo concurso em 1934, que não teve resultados concretos É de registar, assim, a ideia da aceitação pública do corredor Beato Montijo e sobretudo a validação que lhe é dada pelos diferentes engenheiros nas diferentes épocas.
Fig. 4.4.1 Corredores Chelas–Barreiro e Beato–Montijo.

Serão muito profundas as alterações previstas à imagem do estuário por via da construção de uma ponte sujeita às regras de APL[3], nomeadamente no traçado inicial da terceira travessia do Tejo e para vencer o Canal Norte. Para isso seria necessário criar um vão com 900 metros, obrigando pilares junto à margem de Lisboa com cerca de 200m e um gabarito 60 metros, sendo as restantes restrições decorrentes de:

a) Canal Samora____vão________250 metros
gabarito_____41 metros

b) Canal Sul_______vão________550 metros
_______gabarito____58.5 metros

Em alternativa, a APL sugere um traçado 1500 m a montante docom exigências inferiores quanto ao vão e à altura dos pilares da ponte.
a) Canal Norte______vão________450 metros
______gabarito____41 metros

b) Canal Sul________vão________250 metros
_________gabarito____30 metros

A forma, altura e extensão da ponte Chelas Barreiro são assim analisados como elemento de alteração ao plano de água de incidência de vistas. Para esta análise recorreu-se aos dados iniciais ( Março 2007 ???) existentes do projecto da ponte Chelas Barreiro. Estes dados ficavam condicionados às exigências estabelecidas pela APL para os valores mínimos do vão e gabarito acima descritos. Foram identificados pontos de vista ao longo de todo o estuário, Almada, Seixal. Barreiro e Lisboa e foram simulados os efeitos de corte no estuário da ponte Chelas Barreiro (ver Anexos).


3.5 Registo (desenho, simulação, quantificação ) das diferenças previsíveis que poderão ser causadas nas vistas para o estuário.

As diferenças previsíveis que poderão ser causadas nas vistas para o estuário a partir de vários pontos das cidades e não só de Lisboa, foram montadas com a informação disponível sobre o projecto da ponte no corredor Chelas Barreiro e são da responsabilidade do Eng. José Almada ( Anexos)

A partir destas simulações e com vista à participação publica poderia ser feita uma análise de preferências, sendo possível através de inquéritos públicos eficazes, informar a decisão superior
Face a estas alterações da vista do estuário e da perda do sentido de profundidade ou mesmo infinito empiricamente podemos afirmar .que o impacte mais forte é criado pelo conjunto de pilares com cerca de 200m de altura, muito próximos do Castelo de S. Jorge e da Graça cuja encosta ficará reduzida ou visualmente “esmagada” pela ponte atingindo-se por isto a imagem de marca de Lisboa: Tejo, Castelo e profundidade de vistas.
Julgamos também que esta alteração é tão drástica que a população deverá ser ouvida.


4.6 Estudo de alternativa(s) cuja modificação reduza os danos.

O estudo alternativo proposto para o corredor Beato Montijo não tem projecto que possa ser simulado para comparação, reconhecendo-se no entanto que a 1500m a montante as exigências da APL se reduzem, permitindo vãos e pilares de dimensões menores e com consequente impacte visual inferior.
ANGULO DE 24º basta para reduzir o impacte
O quadro comparativo do impacte visual constituído pelos corredores alternativos é apresentado para uma única linha de vistas. O mesmo procedimento pode ser aplicado a outros alinhamentos de vistas (ver anexos) de importância pública ou patrimonial.


Quadro 2 – Comparação da interferência dos 2 corredores alternativos da TTT sobre o estuário do Tejo (ver aqui)


24º
Fig. 4.6.1 Parque Eduardo VII



24º
Fig. 4.6.2 Castelo de S. Jorge


24º
Fig. 4.6.3 Terreiro do Paço

(ver aqui)

O quadro comparativo aplicado a este alinhamento de vistas, o mais frequentado por ser público e patrimonial, permite identificar uma vantagem significativa do corredor Beato-Montijo relativamente a todos os parâmetros em estudo:

Com o alinhamento Beato-Montijo o estuário é cortado em menos 1700 ha do que com o alinhamento Chelas–Barreiro e a linha de corte do estuário tem menos 1,4 km. A partir dos 3 pontos de vista escolhidos, o ângulo de visão sobre o estuário é obstruído pela ponte Chelas–Barreiro em grandes extensões e graças aos 24º de rotação da ponte Beato–Montijo o ângulo de visão, mesmo o mais desfavorável a partir do Terreiro do Paço, inclui a ponte só em metade da sua extensão e a uma maior distância que a ponte Chelas–Barreiro.

Este método permite apresentar resultados os quais deverão ser reforçados por maior numero de aplicações em Lisboa e nas outras cidades.


5. Conclusões

1-Considerando a paisagem constituida pelo sistema estuário, encostas e margens como uma paisagem de excepcional valor para as populações das cidades que se construiram nas suas margens Almada, Barreiro, Lisboa e Seixal;

2- Considerando que a população residente que goza directa e quotidianamente dessa superficie de água de 7000 ha ascende a 770 000, sendo de abranger ainda a populaçao que se desloca na e para a zona em trabalho ou em lazer;

3- Considerando que a paisagem do rio é objecto de apreciação estética a partir de alguns dos monumentos mais visitados do país, como o Castelo de S. Jorge, e de miradouros de grande afluência, como St. Luzia, o valor turístico da importância estética desta vista aumenta em função da densidade da população, da frequência de visitantes nacionais e estrangeiros;

4- Considerando que o valor dessa paisagem deve manter-se máximo, e que qualquer alteração nessa paisagem deve ser reduzida ao mínimo e deve sujeitar-se a um escrutínio publico, seja directo ou por amostragem;

5- Comparativamente o corredor Chelas Barreiro corta o “Mar da Palha” retirando-lhe mais 1700 ha de área de incidência visual relativamente ao corredor Beato Montijo ou seja um terço da área de estuário analisada desaparece ocultada por uma sucessão de pilares com cerca de 40m de altura de qualquer angulo de visão, a partir das 4 cidades.



6. Bibliografia

§ Castel-Branco, Cristina; Le Rivage Méditerranéen des Pyrénés; ICOMOS-UNESCO ; 15 Outubro, 2006.
§ Dramstad, Wenche E.; Olson, James D.; Forman, Richard T.T.; - Landscape Ecology Principles in Landscape Architecture and Land-Use Planning. Island Press, 1996. ISBN 1-55963-514-2
§ Fabos, Julius Gy. - Land-Use Planning from Global to Local Challenge. Chapman and Hall. New York, 1985. ISBN 0-412-25200-7
§ Hough, Michael. - Cities and Natural Process. Routeledge, 1995. ISBN 0-415-12168-X
§ Lynch, Kevin – The image of the city. The M.I.T Press. U.S.A. 1960. ISBN 0-262-12004-6
§ Platt, Rutherford H.; Rowntree, Rowan A.; Muick., Pamela C. - The Ecological City – Preserving and Restoring Urban Biodiversity. The University of Massachusetts Press, Amherst. U.S.A. 1994. ISBN 0-87023-883-3
§ Santarém, the Lezírias and the Tagus – Cultural Landscape. Câmara Municipal de Santarém. Multitema. 2001
§ Simonds, John Ormsbee. Earthscape - A Manual of Environmental Planning. McGraw-Hill Book Company. New York, 1978. ISBN 0-07-057395-6
§ Simonds, John Ormsbee. Landscape Architecture – A Manual of Site Planning and Design. McGraw-Hill Book Company. 1983. ISBN 0-17-057448-0
§ White, K.N.; Bellinger, E.G.; Saul, A.J.; Symes, M.; Hendry, K. – Urban Waterside Regeneration – problems and prospects. Ellis Horwood Limited, Englan,1993. ISBN 0-13-928623-3
§ Steinitz, Carl; Toward a sustainable landscape with high visual preference and high ecological integrity: the loop road in Acadia National Park, U.S.A. In “Landscape and Urban Planning”. Volume 19, número 3, Junho 1990, pp. 213-250.
§ Steinitz, Carl; Simulating alternative policies for implementing the Massachusetts scenic and recreational rivers act: The North River demonstration project. In “Landscape and Planning”. Volume 6, número 1, Maio 1979, pp. 51-89.

[1] França JA, Lisboa: Urbanismo e arquitectura, Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, ed. 1989
[2] www.wikipedia.org
[3] Elementos sobre a 3ª Travessia do Tejo – APL – Administração do Porto de Lisboa.2005



25 Fev. 2008.

Prof. Arq. Cristina Castel-Branco

1 comentário:

aeloy disse...

Este texto da credenciada Prof. é a mostra evidente, mesmo com eventuais incorrecções ou imperfeições, de que a decisão foi leviana, é necessário mais estudos e a correcção da mesma(ponte) se for levada para a frente, seja em termos da estrutura e seu alinhamento, seja em termos de lógica do trafego e seu desenvolvimento. Ainda sem sequer se saber qual a lógica de amarração em Lisboa do TGV (margem norte ou sul vindo do Porto), sem se ter em conta qualquer estudo integrado dos transportes, sem que os problemas do Porto de Lisboa, que são risada no relatório, fraquissimo há que dizé-lo, do LNEC sejam equacionados, sem que o impacto na paisagem tenha sido aflorado, vamos entrar na linha do jamais.
Ainda vamos a tempo de dar lições de françês.
António Eloy