quinta-feira, abril 17, 2008

Coisa outra

Os populismos são imediatistas, emotivos e manipuladores [...] embora não me lembre de nenhum com o qual os povos se tenham dado bem

Não é a primeira vez que Silvio Berlusconi ocupa o cargo de presidente do Conselho de Ministros de Itália: da última vez foi-o até Abril de 2006. Regressa em Abril de 2008, pela terceira vez.
Berlusconi, senhor de um império empresarial que se estende da construção civil ao futebol, incluindo, muito a propósito, os media, ganhou confortavelmente as eleições em Itália.

É de Silvio Berlusconi uma frase – Fevereiro de 2006 – sintomática e de modéstia tocante: "Só Napoleão fez mais do que eu fiz. Mas, com certeza, eu sou mais alto do que ele." E brindou--nos recentemente com um espantoso conselho para ultrapassar a pobreza: "Case-se com um milionário."
Por que razão a Itália reelege "o rei da gaffe", como lhe chamou o ‘Observer’?

Veltroni não foi alternativa, enredado na herança de Prodi e num passado político que ficou sem representação parlamentar. Berlusconi é populista e os populistas sabem, como ninguém, viver politicamente de meias verdades – convém não ignorar – e aproveitar os medos ou insatisfações colectivas. Os populismos são imediatistas, emotivos e manipuladores e o espectáculo inicial a que não se eximem ajuda-os, embora não me lembre de nenhum com o qual os povos se tenham dado bem.

Não espanta por isso, muito menos em época de crise – a inflação na Zona Euro está em 3,6% – o anúncio imediato de ‘caça’ aos imigrantes ilegais – esses desafortunados dos desafortunados – nem o anúncio conjugado da resolução do problema do lixo de Nápoles (é assim, ambos os assuntos referidos numa mensagem que se diria subliminar). Lixo. Berlusconi promete tratar do lixo: o de Nápoles e o ‘humano’.

Berlusconi é politicamente um retrocesso civilizacional: demonstrou-o ao não respeitar a matriz da separação de poderes que vai garantindo o possível equilíbrio institucional nos nossos sistemas políticos. Mas está de volta, com tudo o que significa de confusão público-privado, ou melhor, privado-público.

Na Europa era preciso coisa outra.

Entre nós – ferido Menezes – Santana Lopes, que não dispõe de império algum, não resistiu a festejar com entusiasmo a vitória de Berlusconi, quem sabe revendo-se em sonhos num regresso ao futuro. Ao fim e ao cabo passaram uns anos e quem sabe se a incubadora onde depositaram o menino guerreiro desta vez não abana. Para mal certo de todos nós e uma não menos infernal alegria de Sócrates.

Entre nós, é urgente coisa outra.



Paula Texeira da Cruz


In Correio da Manhã

3 comentários:

Anónimo disse...

Não sei se o melhor será nas próximas eleições Menezes+Santana espalharem-se ao comprido, para ver se a coisa muda de vez. Caso contrário, armar-se-ão sempre em grandes vítimas. E mesmo assim...

Miguel Carvalho disse...

Estive em Itália durante a campanha e pude observar as enormes imbecilidades que saem da boca do Cavaliere. Nada que não soubesse à distância, mas in loco a diversidade é maior.

A que mais me ficou na memória foi um discurso perante as mulheres do partido dele há 2 semanas. Dizia que no dia das eleições as mulheres italianas deveriam fazer aquilo que sabem fazer melhor: cozinhar. Deveriam cozinhar petiscos para quem está a trabalhar nas urnas de voto e para quem vai votar. Mereceu uma sonora e longa ovação das presentes.

Anónimo disse...

É impressão minha ou Mário Soares também disse isso da então candidata a presidente do PE? Coisas.